Os relatos do "inimaginável" sofrimento animal no incêndio de Santo Tirso ouvidos no Porto
Uma vigília para recordar a quem esteve ausente o cenário "dantesco" onde morreram 74 animais
Vários envolvidos no salvamento de animais em abrigos atingidos por um incêndio florestal na serra de Agrela, em Santo Tirso, recordaram hoje, durante uma vigília no Porto, um cenário "dantesco" e "dificilmente imaginável" por quem esteve ausente.
Luís, um dos voluntários chamados a testemunhar perante dezenas de pessoas que acorreram à vigília, produziu um dos mais emocionados depoimentos, recordando o "cheiro a carne queimada" de animais mortos ou vivos, mas já "em grande sofrimento".
"Um cenário dantesco, inimaginável. Nem nos meus piores momentos eu poderia imaginar aquilo que vi", afirmou.
Durante a vigília, frente à Câmara do Porto, fez-se minuto de silêncio pelos 74 animais mortos e procedeu-se à recolha de dinheiro e materiais para ajudar as associações envolvidas no tratamento de 190 outros animais resgatados.
A iniciativa foi promovida pela organização Porto Animal Save que, pela voz do seu dirigente Eduardo Martins, sublinhou as responsabilidades desta organização na denúncia de situações como a de Santo Tirso.
"O nosso trabalho é precisamente esse: testemunhar o sofrimento animal, a exploração, negligência e maus tratos", disse.
Eduardo Martins, que falava a jornalistas cerca das 18:00, disse que a vigília registava então a adesão de "um pouco mais de 50 pessoas", menos do que o esperado.
"O que nos diziam as redes sociais é que iriam estar quase 300 pessoas", afirmou então.
Na sequência do incêndio que lavrou último fim de semana na serra da Agrela, concelho de Santo Tirso, distrito do Porto, morreram sete dezenas e meia de animais que ali se encontravam em abrigos ilegais e 190 foram resgatados com vida, tendo sido acolhidos por associações, particulares e canis municipais.
O caso teve repercussões a diversos níveis, chegando mesmo a ser abordado durante o debate do estado da nação, sexta-feira, na Assembleia da República.
O primeiro-ministro, António Costa, admitiu então repensar a orgânica do Estado em matéria de protecção animal e referiu-se ao sucedido na Agrela como um "massacre chocante" e algo "absolutamente intolerável".
Em dias anteriores, o Parlamento aprovou audições sobre o assunto do director-geral de Alimentação e Veterinária, do ministro da Agricultura, bem como do seu homólogo da Administração Interna que, entretanto, mandou abrir um inquérito à actuação da GNR e da Protecção Civil no incêndio.
O presidente da câmara de Santo Tirso, Alberto Costa, que será igualmente chamado à Assembleia da República, suspendeu o veterinário municipal, sujeitando-o a um processo disciplinar, e retirou o pelouro da Protecção da Vida Animal ao vereador José Pedro Machado, chamando a si "todo o processo relacionado com o abrigo dos animais".
O autarca socialista, cuja actuação também foi questionada pelo menos por estruturas comunistas e social-democratas locais, mostrou-se igualmente disponível para colaborar com o Ministério Público que abriu um inquérito ao caso, depois de em 2018 ter arquivado outro processo sobre o abrigo.