24 horas
A recente deslocação de Marcelo Rebelo de Sousa à Madeira serviu para serenar os ânimos do Governo Regional e dos dirigentes do PSD-M durante 24 horas. Todos se renderam ao frenesim presidencial, que fez tábua rasa do distanciamento social e de todas as orientações sanitárias em vigor. Durante 24 horas o séquito que acompanhou Marcelo, e ele próprio, deu o exemplo contrário do que deve ser a convivência e o relacionamento humano em época de pandemia.
Durante aquele período suspendeu-se, também, as críticas, algumas bem ácidas e a putativa candidatura presidencial de Miguel Albuquerque. Remaram todos para o mesmo lado. A Marcelo, hábil mestre político, restou ‘surfar a onda’ e fazer o que melhor sabe: distribuir afecto e simpatia, tirar selfis, furar o protocolo. Ninguém resistiu ao ‘furacão’, que andou pelo centro até à meia-noite, tendo ido beber poncha à Zona Velha, local de peregrinação nocturna flagelado pelos efeitos do vírus e que luta para não fechar a maioria dos seus estabelecimentos. Obcecado que está por uma reeleição que ultrapasse os 70,35% conseguidos por Mário Soares em 1991, também na sua recandidatura a Belém, o Presidente fez de tudo para gerar um ambiente propício à pacificação política. Viu e ouviu muito, é certo.
Querendo unir a direita à sua volta, evitando a tudo o custo o surgimento de mais candidaturas dessa área, Marcelo trouxe a sua agenda na visita à Região, decidida em cima da hora. Miguel Albuquerque não teve outra alternativa que não fosse receber o político mais popular do país, estender-lhe o tapete e abrir-lhe os braços. E isso resolverá os problemas mais impactantes? Não é crível, como já admitiu o próprio presidente do Governo Regional, no debate do estado da Região na Assembleia Legislativa, em que mais uma vez, se disparou a eito contra a República, eleita capital de todos os males que fustigam a Madeira.
A visita de Marcelo encarnou muita hipocrisia política e muitos sorrisos de circunstância que não garantem a resolução dos problemas pendentes com o Governo de António Costa. O Presidente não vai abrir uma guerra com o primeiro-ministro por causa da Madeira. Sejamos realistas. É importante que cá venha? É. É importante que regresse ainda este Verão? É. Mas os problemas da Região jogam-se noutro tabuleiro e com uma postura diferente. Marcelo pode ajudar? Pode. Vai ajudar? Depende de uma série de factores e do seu próprio calendário político, em que Costa e o apoio oficial socialista à sua recandidatura assumem preponderante relevância.
A hipocrisia deveria dar lugar a acções concretas, no terreno, como na mediação do conflito Funchal-Lisboa, promovendo pontes.
Entretanto os sinais de uma monumental crise económica e social agravam-se. A cada semana que passa há mais empresas e trabalhadores em layoff (44 mil), o desemprego aumenta, a retoma é uma miragem e a pobreza sobe. Muitas das micro e pequenas empresas estão a sucumbir. É para aí que todas as energias e o pensamento estratégico têm de ser canalizados. Com ou sem o popular Marcelo no recinto.