Credores privados dizem que cobrar juros é essencial para manter ‘ratings’
O Instituto Financeiro Internacional (IFI), representante dos credores da dívida privada dos países mais vulneráveis, disse hoje que cobrar juros durante a moratória é fundamental para evitar uma descida do ‘rating’ dos países aderentes à iniciativa.
“A cobrança de juros durante o período da moratória não foi avançada pelo setor privado, estava nos termos originais da proposta do G20 para os credores oficiais, e como os termos da Iniciativa da Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI) ditam que o setor privado deve participar em termos similares, nós incluímo-la”, afirmaram os credores numa nota enviada à Lusa.
Na nota, que serve de resposta a vários “mitos” sobre a proposta apresentada na semana passada relativamente aos termos de referência da negociação da reestruturação da dívida privada, os credores argumentaram que “manter a cobrança de juros ajuda a manter o valor líquido atual, que é fundamental para evitar uma descida do ‘rating’ e manter o acesso futuro aos mercados dos países participantes na iniciativa”.
Em causa está a assunção por parte de algumas agências de ‘rating’, como por exemplo a Moody’s, de que se os credores receberem menos do que o inicialmente contratualizado, isso configura um ‘default’, Incumprimento Financeiro, independentemente das razões e mesmo com o acordo dos credores.
Respondendo aos “mitos” sobre a posição dos credores, o IFI argumentou também que não está a adiar propositadamente as negociações, tendo realizado mais uma reunião com os ministros das Finanças africanos na quarta-feira e garantiu que o objetivo é “que nenhum país tenha de escolher entre comprar ventiladores ou pagar a dívida”.
“Nestas reuniões ouvimos diretamente dos países sobre a importância de equilibrar a necessidade de liquidez de curto prazo com a necessidade de manter o acesso aos mercados a seguir à pandemia da covid-19 e, como resultado direto destas reuniões, os nossos termos de referência maximizam a participação do setor privado ao mesmo tempo que evitam uma descida do ‘rating’”, argumentaram os credores.
Na nota, o IFI considerou ainda que o melhor rumo de ação é uma abordagem caso a caso e não um programa genérico para todos os países.
“Uma abordagem de cima para baixo, de tamanho único, não funciona porque é impossível harmonizar toda a homogeneidade dos países elegíveis para a DSSI, de maneira simples, a Zâmbia não é o Quénia, o Quénia não é a Mongólia, e a Mongólia não é o Paquistão, cada país entra na crise numa situação orçamental única, e tem um perfil de dívida único, por isso é imperativo que os credores consigam coordenar-se com cada país de forma individual e organizem uma solução que funcione bem para todos os intervenientes”, explicaram.
A assunção do problema da dívida como uma questão central para os governos africanos ficou bem espelhada na preocupação que o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial dedicaram a esta questão durante os Encontros Anuais, que decorreram em abril em Washington, na quais disponibilizaram fundos e acordaram uma moratória no pagamento das dívidas dos países mais vulneráveis a estas instituições.
Em 15 de abril, também o G20, o grupo das 20 nações mais industrializadas, acertou uma suspensão de 20 mil milhões de dólares, cerca de 18,2 milhões de euros, em dívida bilateral para os países mais pobres, muitos dos quais africanos, até final do ano, desafiando os credores privados a juntarem-se à iniciativa.
Além disso, a Comissão Económica das Nações Unidas para África (UNECA), entre outras instituições, está a desenhar um plano que visa trocar a dívida soberana dos países por novos títulos concessionais que possam evitar que as verbas necessárias para combater a covid-19 sejam usadas para pagar aos credores.
Este mecanismo financeiro seria garantido por um banco multilateral com ‘rating’ de triplo A, o mais elevado, ou por um banco central, que converteria a dívida atual em títulos com maturidade mais alargada, beneficiando de cinco anos de isenção de pagamentos e cupões (pagamentos de juros) mais baixos, segundo a UNECA.
O número de mortos em África devido à covid-19 subiu nas últimas 24 horas para 4.756, mais 155, em quase 170 mil casos, nos 54 países, segundo os dados da pandemia no continente.
A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de covid-19 já provocou perto de 391 mil mortos e infetou mais de 6,6 milhões de pessoas em 196 países e territórios. Mais de 2,8 milhões de doentes foram considerados curados.
A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.