Saúde de presos políticos na Venezuela motiva apelo à ONU de deputados e lusodescendente
Deputados do parlamento da Venezuela e familiares de detidos, incluindo de um lusodescendente, pediram na terça-feira à Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachellet, que verifique o estado de saúde dos presos políticos.
O pedido foi feito numa sessão parlamentar virtual, durante a qual a deputada Adriana Pichardo afirmou que está ser negada atenção médica aos presos políticos, numa altura de pandemia.
“Temos vindo a monitorizar as graves condições em que se encontram mais de 500 presos políticos no país, perante a sobrelotação e carências sanitárias dos centros penitenciários, o que põe em risco as suas vidas”, disse a deputada.
Ana Maria da Costa, irmã do preso político e politólogo lusodescendente Vasco da Costa, que participou na sessão, disse que o irmão e outros detidos estão a ser vítimas de “tratamentos cruéis e desumanos”.
“Desde que o sargento Darwing Balaguera fugiu do Hospital Militar, na área de réus militares, são algemados às camas e deixam a luz acesa durante a noite”, acusou.
Ana Maria da Costa responsabiliza o Presidente Nicolás Maduro e vários militares “pela integridade física de Vasco da Costa” e outros detidos que “são submetidos a tratamentos cruéis e desumanos”.
Filho de um antigo vice-cônsul de Portugal em Caracas, Vasco da Costa, de 61 anos, foi detido na sua casa em abril de 2018 por agentes do SEBIN (serviços secretos da Venezuela), acusado de promover a abstenção nas eleições presidenciais de maio de 2018.
Vasco da Costa já tinha estado detido entre julho de 2014 e outubro de 2017. Nessa altura, foi acusado de ligações a uma farmacêutica que estaria, alegadamente, envolvida em planos para fabricar engenhos explosivos artesanais, durante os protestos ocorridos no primeiro semestre de 2014 contra o Governo do Presidente venezuelano, Nicolás Maduro.
Segundo a irmã, o próprio Ministério Público admitiu que o crime de terrorismo de que Vasco da Costa está acusado “não existe”, e questionou por que razão, assim sendo, o irmão está “detido há mais de dois anos na pior das cadeias venezuelanas”.
Esta não é a primeira vez que o estado de saúde do lusodescendente é questionado.
Em agosto de 2019, uma organização não-governamental venezuelana acusou funcionários da Direção de Contrainteligência Militar (serviços secretos militares) de destruírem medicamentos oncológicos de Vasco da Costa, durante uma “rusga violenta”.
“Os funcionários tiraram-lhe os poucos medicamentos a que teve acesso, para tratar das doenças de que padece, assim como de um cancro no olho, que é muito grave e que requer atenção”, disse então o vice-presidente do Foro Penal Venezuelano (FPV), Gonzalo Himiob.
Hoje, a deputada Adriana Pichardo alertou para o agravamento da situação dos detidos, desde que o Governo venezuelano proibiu, há três meses, visitas de familiares a presos políticos.
“Existem casos gravíssimos de desamparo e de tortura, como os do capitão Caguaripano, do general Baduel e do filho Yosnel Baduel”, explicou.
Durante a sessão, a deputada Marianella Fernández pediu ainda ao Alto Comissário da ONU para os Refugiados (ACNUR), à Comunidade Andina de Nações e à Organização Interamericana para as Migrações (OIM) que reforcem a atenção aos venezuelanos “refugiados” em países vizinhos.
“A migração de compatriotas trouxe muita dor, sacrifício, separação da família e hoje eles são vítimas de xenofobia e de todas as dificuldades que acompanham os emigrantes”, disse.
Venezuela suspende desfiles militares devido ao aumento de casos
Entretanto o Presidente da Venezuela suspendeu a realização dos desfiles militares que assinalariam o 199º. aniversário da Batalha de Carabobo e o 208.º aniversário da assinatura da Ata da Independência, devido ao aumento de casos de coronavírus.
“Por motivo da quarentena radical, suspenderam-se os atos dos desfiles de 24 de junho e 01 de julho”, disse Nicolás Maduro à televisão estatal venezuelana.
A Batalha de Carabobo teve lugar em 24 de junho de 1821 e foi uma das principais ações militares na luta pela independência da Venezuela. Nessa data, o exército patriótico venceu o exército real espanhol no Campo de Carabobo (centro do país).
A assinatura da Ata da Independência teve lugar em 05 de julho de 1811.
“Este ano não pode haver desfiles. Faremos isso depois, porque estamos a cumprir a quarentena estrita, radical e necessária para cortar as cadeias de transmissão do surto que temos”, disse.
A Venezuela tem 4.186 casos confirmados de coronavírus e 35 mortes associadas à covid-19. Segundo os dados das autoridades, 1.327 pessoas recuperaram da doença.
Na segunda-feira, o Presidente Nicolás Maduro alertou que os venezuelanos enfrentavam “um surto perigoso de coronavírus na maioria das grandes cidades do país”, afirmando que para o eliminar era preciso “quarentena disciplinada e medidas sanitárias, acatadas por todos”.
Hoje, as autoridades encerraram um estabelecimento de uma rede de supermercados de portugueses, em El Cafetal (Baruta, Caracas), para uma desinfeção absoluta, depois de duas dezenas de empregados apresentaram sintomas de possível contágio por coronavírus.
O presidente da Câmara Municipal de Baruta, Darwin González, pediu calma aos residentes em El Cafetal, uma zona com importante presença de portugueses, enquanto se aguardam os resultados dos testes.
A Venezuela reforçou na segunda-feira a quarentena instaurada para combater a propagação do novo coronavírus em 10 dos 24 Estados do país, incluindo no Distrito Capital.
As novas medidas, que as autoridades locais dizem ser uma “radicalização” da quarentena, têm lugar depois de uma flexibilização de sete dias.
Ao abrigo do reforço das medidas, o Metropolitano de Caracas encerrou as portas, e as autoestradas e ruas principais de algumas zonas residenciais estão bloqueadas, com restrições à circulação de pessoas, incluindo no centro da capital.
Com os setores prioritários (supermercados, farmácias) a funcionarem apenas durante algumas horas por dia, várias zonas de Caracas registam apagões elétricos, com muitos clientes a queixarem-se de que nos últimos dias estiveram sem serviço de Internet, impedindo-os de aceder a alguns canais de televisão, depois de a principal operadora de cabo, a Directv, ter saído do país, em 19 de maio.
A Venezuela está desde 13 de março em estado de alerta, o que permite ao executivo decretar “decisões drásticas” para combater a pandemia.
Os voos nacionais e internacionais estão restringidos no país.
Desde 16 de março que os venezuelanos estão em quarentena e impedidos de circular livremente entre os vários Estados do país.
A pandemia de covid-19 já provocou mais de 473 mil mortos e infetou mais de 9,1 milhões de pessoas em 196 países e territórios, segundo um balanço feito pela agência de notícias France-Presse (AFP).
A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.
Depois de a Europa ter sucedido à China como centro da pandemia em fevereiro, o continente americano é agora o que tem mais casos confirmados e mais mortes.