Alcunha de “bispo vermelho” não incomoda bispo madeirense e novo presidente da Conferência Episcopal
O novo presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) e atual bispo de Setúbal assegurou hoje que não ficaria incomodado se lhe chamassem “bispo vermelho”, epíteto que foi atribuído ao primeiro responsável da diocese, Manuel Martins, já falecido.
“Eu não sou daltónico e gosto de todas as cores. Só com os tons de cinzento é que não me sinto bem. Não me preocupa isso. D. Manuel Martins, que foi ordenado bispo de Setúbal em 1975, foi alguém que marcou o caminho da Igreja de Setúbal no Portugal novo democrático”, disse em entrevista à Lusa, após a sua eleição para presidente da CEP, na terça-feira.
José Ornelas respondeu desta forma ao ser confrontado com o percurso de Manuel Martins, que muitas vezes se juntou à luta de trabalhadores ameaçados de despedimento e na defesa dos direitos dos mais desfavorecidos no período pós-revolucionário do 25 de Abril de 1974.
Num distrito em que o flagelo do desemprego esteve durante muito tempo acima da média nacional e com maiorias comunistas no poder autárquico, Manuel Martins, pelas suas ações em prol dos mais desfavorecidos, rapidamente transformou a contestação inicial de que foi alvo, numa atitude de respeito por parte da população e dos poderes locais, ao ponto de se ter tornado uma voz incómoda para o poder central.
O atual bispo de Setúbal e agora também presidente da CEP também já fez ouvir a sua voz em defesa dos estivadores de Setúbal contratados à jorna e, mais recentemente, para mostrar a sua indignação pelas condições de vida de dezenas de famílias que vivem no bairro da Jamaica, no Seixal, e que considerou “uma vergonha”.
Em entrevista à agência Lusa, José Ornelas não só diz não estar nada incomodado com a possibilidade de o apelidarem de “bispo vermelho”, como elogia o percurso do primeiro bispo de Setúbal e o legado de um bom relacionamento da Igreja com as diferentes estruturas de poder na região, que começou com o trabalho desenvolvido por Manuel Martins.
“Por mim, dou sempre graças a Deus pelo primeiro bispo que tivemos [em Setúbal]. Vamos ter mais bispos, mas o primeiro vai ser sempre ele. E é bom ter sido D. Manuel Martins, porque ele não se guiava por cores, mas pelo Evangelho”, disse.
“E era em nome do Evangelho que ele tinha aquela ideia de que o mundo deve ser de cuidadores e não de predadores”, acrescentou José Ornelas.