Especialistas dizem que Trump tem direito a usar tropas federais
O aviso do Presidente dos EUA, Donald Trump, de que enviaria forças militares para qualquer Estado que se recuse a tomar ações agressivas contra os tumultos repousa sobre um poder presidencial de longa data, dizem especialistas.
“Se uma cidade ou Estado se recusar a tomar as medidas necessárias para defender a vida e a propriedade dos residentes, enviarei as forças armadas dos Estados Unidos e rapidamente resolverei o problema”, disse na passada semana Trump, enquanto dezenas de cidades estavam envolvidas em tumultos e saques, provocados por manifestações contra a morte de George Floyd, um homem negro morto sob custódia policial, em Minneapolis.
Vários especialistas jurídicos dizem que o Presidente tem autoridade para tomar essa decisão, ao abrigo da Lei da Insurreição, de 1807, que permite enviar forças militares para Estados que não conseguem reprimir uma insurreição ou que estejam a desafiar leis federais.
Nos últimos 50 anos, os Presidentes enviaram militares para Estados do sul, quando foi necessário garantir que escolas não tomassem medidas segregacionistas e para proteger direitos civis, nas décadas de 1950 e 1960, e para Los Angeles, quando o governador da Califórnia procurou ajuda federal, perante os distúrbios de 1992.
Ainda assim, os comentários de Trump criaram desconforto junto de alguns governos estaduais, que contestaram que o Presidente tivesse autoridade para enviar tropas, contra a sua vontade.
“O Presidente dos Estados Unidos não é um ditador e o Presidente Trump não domina o Estado de Nova York”, disse a procuradora-geral de Nova York, Letitia James, num comunicado, na segunda-feira, acrescentando que o Estado estava preparado para ir a tribunal, se fosse necessário.
Uma das principais vozes democratas em matérias de segurança nacional, Michele Flournoy, que é ex-oficial do Pentágono, disse hoje que Trump deve evitar o uso de forças militares ativas, exceto em último recurso.
“A maioria dos ex-Presidentes entendeu a extrema sensibilidade de usar as forças armadas dos EUA contra cidadãos americanos”, disse Flournoy.
Contudo, a especialista reconhece autoridade legal para Trump tomar essa decisão, invocando a Lei da Insurreição.
A União Americana das Liberdades Civis (ACLU, na sigla em inglês) disse que seria desnecessário invocar a Lei da Insurreição, considerando a decisão como “irresponsável e perigosa”.
“Nenhum governador está a pedir uma resposta militarizada aos protestos civis contra a brutalidade policial e o racismo sistémico. Por boas razões”’, disse a diretora do Projeto de Segurança Nacional da ACLU, Hina Shamsi.
Segundo a lei, Trump primeiro terá que exigir que os manifestantes se dispersem e se pacificamente, num certo prazo, findo o qual ele poderá ativas as tropas federais, alegando situação de emergência, sem o pedido de um governador.
Stephen Vladeck, especialista em segurança nacional e direito constitucional, da Universidade do Texas em Austin, escreveu na sua conta da rede social Twitter que o Governo federal não precisa necessariamente de um pedido do Estado, antes de usar tropas para aplicação da lei doméstica.
Vladeck diz ainda que a Lei da Insurreição permite que o Presidente decida quando é válido usar as tropas federais.
O professor da Universidade do Texas, lembra que a Lei da Insurreição não era usada desde 1992, em parte por causa da impopularidade de usar tropas para fins domésticos.
George Floyd, um afro-americano de 46 anos, morreu em 25 de maio, em Minneapolis (Minnesota), depois de um polícia branco lhe ter pressionado o pescoço com um joelho durante cerca de oito minutos numa operação de detenção, apesar de Floyd dizer que não conseguia respirar.
Desde a divulgação das imagens nas redes sociais, têm-se sucedido os protestos contra a violência policial e o racismo em dezenas de cidades norte-americanas, algumas das quais foram palco de atos de pilhagem.
Pelo menos quatro mil pessoas foram detidas e o recolher obrigatório foi imposto em várias cidades, incluindo Washington e Nova Iorque, mas diversos comentários do Presidente norte-americano, Donald Trump, contra os manifestantes têm intensificado os protestos.
Os quatro polícias envolvidos no incidente foram despedidos, e o agente Derek Chauvin, que colocou o joelho no pescoço de Floyd, foi detido, acusado de assassínio em terceiro grau e de homicídio involuntário.
A morte de Floyd ocorreu durante a sua detenção por suspeita de ter usado uma nota falsa de 20 dólares (18 euros) numa loja.