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Marcelo defende que é tempo de acordar e fazer mudanças com coragem

O Presidente da República defendeu hoje que é tempo de Portugal acordar para a nova realidade resultante da pandemia de covid-19 e fazer as mudanças que se impõem, com coragem, sem voltar às soluções do passado.

“Portugal não pode fingir que não existiu e existe pandemia, como não pode fingir que não existiu e existe brutal crise económica e financeira. E este 10 de Junho de 2020 é o exato momento para acordarmos todo para essa realidade”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, na cerimónia comemorativa do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, em Lisboa.

O chefe de Estado, que discursava nos claustros do Mosteiro dos Jerónimos, acrescentou: “Não podemos entender que nada ou quase nada se passou, como não podemos admitir que algo de grave ou muito grave ocorreu e esperar que as soluções de ontem sejam as soluções de amanhã, como não podemos concordar com a inevitabilidade da mudança e nada fazer por ela”.

O Presidente da República apontou os próximos meses e anos como “uma oportunidade única para mudar o que é preciso mudar com coragem e determinação” e rejeitou que se opte por “remendar, retocar, regressar ao habitual, ao já visto, como se os portugueses se esquecessem do que lhes foi, é e vai ser pedido de sacrifício e se satisfizessem por revisitar um passado que a pandemia submergiu”.

Na sua intervenção, de cerca de dez minutos, Marcelo Rebelo de Sousa criticou também que se pense que “é já chegada a hora de fazer cálculos pessoais ou de grupo, de preferir o acessório àquilo que durante meses considerámos essencial, de fazer de conta que o essencial já está adquirido, já passou, já cansou, já é um mero álibi para apagar a liberdade e controlar a democracia”.

Ao longo do seu discurso, o chefe de Estado foi questionando se existe ou não uma compreensão da atual realidade: “Percebemos mesmo o que se passou e passa, ou apesar de concordarmos com os desafios deste tempo preferimos voltar ao passado naquilo em que ele já não serve ou já não é suficiente?”.

Referindo-se à situação nacional, acrescentou: “Percebemos mesmo que em Portugal ela significou até agora cerca de 1500 mortes, mais dezenas de milhares de pacientes, mais três centenas de milhares de desempregados, oito centenas de milhares de trabalhadores em ‘lay-off’, milhares e milhares de empresas paradas meses, setores totalmente paralisados? Ou comparamos com outras epidemias e com outras crises financeiras e económicas das últimas décadas e minimizamos o que vivemos?”

E considerou que houve falhas: “Percebemos mesmo aquilo que, apesar das devoções de tantas e tantos, falhou na saúde, na solidariedade social, no público, no privado, no social?”

No seu entender, a situação em que Portugal se encontra, três meses depois de terem sido detetados os primeiros casos de covid-19 no país, só foi possível porque os portugueses se comportaram “com sensatez e maturidade”, porque “os políticos fizeram uma trégua de dois meses e uniram-se no essencial”, porque os serviços básicos “não faltaram” e na saúde houve um “heroísmo ilimitado, a fazer de carências e improvisos excelência”.

“Percebemos mesmo que a pandemia ainda não terminou e que a economia e a sociedade ainda estão longe de terem arrancado sustentadamente, o que nos obriga a ter de sofrer de um lado e de recriar do outro, ao mesmo tempo?”, prosseguiu.

Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, parece haver uma oscilação entre um desânimo com os números da pandemia que leva a contestar a “rapidez da abertura” e um desespero com os números da economia e uma consequente condenação do “excesso de contenção”.

“Percebemos mesmo que a pandemia foi global, ou quase global, criou medos e inseguranças, exacerbou egoísmos, intolerâncias, recusas dos outros e do diferente, parou economias, refez fronteiras, travou comércio, congelou movimentos de pessoas e movimentos? Ou pensamos, como alguns outros que se recusaram a agir em tempo devido, que tudo foi um equívoco, um excesso, uma precipitação, um exagero político ou mediático?”, interrogou.

Marcelo Rebelo de Sousa terminou o seu discurso, no último 10 de Junho do seu mandato, lembrando as lições de há cem anos: “Desperdiçámos uma oportunidade única para sermos uma democracia moderna, livre e inclusiva. Desperdiçámos a lição da pneumónica, da última grande pandemia, e da crise económica, social e política que lhe seguiu”.

“Cem anos depois, não cometeremos o mesmo erro. Não desperdiçaremos o frémito nacional que vivemos, a oportunidade singular de começar de novo. Hoje, com o que já sofremos e o que vamos sofrer, o que 10 de Junho nos impõe é não perder o instante irrepetível, honrar os mortos, mobilizar os vivos, unir as vontades, converter o medo em esperança, pensar diferente, fazer um Portugal com futuro”, concluiu.

Devido à pandemia de covid-19, o Presidente da República cancelou no final de março as comemorações do 10 de Junho que estavam previstas para a Madeira e África do Sul e optou por fazer em Lisboa uma cerimónia “pequena, simbólica”, com apenas seis convidados, como seu entender deveriam ter sido celebrados o 25 de Abril e o 1.º de Maio.

Nesta cerimónia, discursou também o cardeal e poeta madeirense José Tolentino Mendonça, escolhido pelo chefe de Estado para presidir à comissão organizadora das comemorações do Dia de Portugal.

Os seis convidados presentes foram o presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, o primeiro-ministro, António Costa, e os presidentes do Tribunal Constitucional, Manuel da Costa Andrade, do Supremo Tribunal Administrativo, Dulce Neto, do Supremo Tribunal de Justiça, António Piçarra, e do Tribunal de Contas, Vítor Caldeira, seis altas entidades que estão nos primeiros lugares da lista de precedências do Protocolo do Estado.

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