Aquecimento global leva a combinações fatais de humidade e calor, alerta estudo
O aquecimento global está a gerar em alguns lugares do planeta combinações de humidade e calor potencialmente fatais para o ser humano, alerta um estudo liderado pela Universidade de Columbia, Estados Unidos, hoje divulgado.
O estudo alerta que a realidade já ultrapassou projeções anteriores que apontavam para o final do século como o horizonte para começarem a ocorrer em alguns lugares dos trópicos e sub-trópicos, fenómenos de calor e a humidade combinados que poderiam atingir níveis raramente experimentados pelos seres humanos, devastando economias e ultrapassando a capacidade de sobrevivência humana.
Segundo a investigação agora divulgada, essas combinações fatais já começaram.
O estudo identifica milhares de situações de calor e humidade extremos, raros ou sem precedentes, em locais da Ásia, África, Austrália, América do Sul e América do Norte.
Ao longo do Golfo Pérsico os investigadores identificaram mais de uma dúzia de breves eventos recentes que ultrapassaram o limite teórico de sobrevivência humana.
Os autores do estudo, publicado na revista científica “Science Advances”, dizem que esses eventos foram até agora confinados a áreas muito localizadas e que duraram apenas algumas horas, embora estejam a aumentar de frequência e de intensidade.
“Estudos anteriores projetavam que isso aconteceria daqui a várias décadas, mas isto mostra que está a acontecer agora mesmo”, afirmou um dos principais autores do trabalho, Colin Raymond, do Observatório da Terra Lamont-Doherty, da Universidade de Columbia.
E alertou: “Os tempos de duração desses eventos aumentam, bem como as áreas que eles afetam, em relação direta com o aquecimento global”.
Os investigadores analisaram dados recolhidos por estações meteorológicas de 1979 até 2017 e descobriram que combinações extremas de calor e humidade aumentaram nesse período para o dobro.
Casos extremos mais frequentes deram-se em locais da Índia, Bangladexe e Paquistão, no noroeste da Austrália, e ao longo da costa do Mar Vermelho e do Golfo da Califórnia, no México.
As leituras mais altas e potencialmente fatais foram identificadas 14 vezes nas cidades de Dhahran/Damman (Arábia Saudita), Doha (Catar), e Ras Al Khaimah (Emirados Árabes Unidos).
Os investigadores dão conta ainda de outros lugares, como o sul da China e vários estados dos Estados Unidos, sendo Nova Orleães e Biloxi, no Mississípi, os piores lugares.
É natural, dizem os autores do estudo, que estes eventos aconteçam nas zonas de costa ou de mares interiores, golfos e estreitos, onde a evaporação da água do mar é aspirada pelo ar quente. Em zonas de interior os ventos de monção carregados de humidade e grandes áreas de irrigação parecem ter o mesmo papel.
A humidade piora os efeitos do calor porque o ser humano arrefece o corpo com a transpiração. O processo funciona bem, por exemplo, no deserto, mas em regiões húmidas, onde o ar já está saturado e absorve menos humidade, a evaporação do suor diminui e pode parar em casos extremos e levar ao aquecimento do corpo para fora dos limites de sobrevivência.
Os meteorologistas medem os efeitos calor/humidade numa medida chamada de “bulbo húmido”, que é a temperatura mais baixa que se pode obter apenas pela evaporação da água e que indica a quantidade de humidade no ar.
Com uma humidade de 50% e uma temperatura do ar de 46° C (graus celsius) atinge-se a temperatura de “bulbo húmido” de 35 graus, considerados os limites teóricos de sobrevivência. E essa temperatura já foi atingida durante alguns momentos em cidades do Golfo Pérsico. Temperaturas mais baixas mas que se acreditava acontecerem raramente já foram atingidas mais de mil vezes, segundo o estudo.
Os investigadores notam que nos Estados Unidos o calor já mata mais pessoas do que qualquer outro problema relacionado com o clima, incluindo o frio, os furacões ou as inundações.
Uma das formas de atenuar os efeitos da combinação mortífera passa pelo uso de ar condicionado, mas os países mais pobres não têm acesso a esse bem e por vezes nem energia elétrica, dependendo a maior parte da população da agricultura de subsistência, que exige mão-de-obra ao ar livre.
As medições agora divulgadas no estudo indicam que “algumas áreas da Terra estão muito mais próximas do que era esperado de atingirem níveis de temperatura intoleráveis”, disse Steven Sherwood, climatologista da Universidade de Nova Gales do Sul, Austrália.