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O Triângulo das Bermudas português

Este famoso triângulo, cujos vértices são a Florida, Porto Rico e as Bermudas, é conhecido pelas tragédias aéreas e marítimas. Desastres, desaparecimentos e naufrágios são frequentes aqui. Vem esta analogia a propósito de outro triângulo, muito atribulado recentemente, aquele formado por Lisboa, Ponta Delgada e o Funchal.

Após a autodeterminação dos territórios ultramarinos, Portugal está só representado por este triângulo. É, no entanto, um triângulo bem assimétrico pois, cada vértice insular representa cerca de 2% da população portuguesa e, o continental, 95%. A riqueza, medida em poder de compra, é também mais elevada em média no Continente.

Politicamente, as águas oceânicas do triângulo são quentes, o que habitualmente cria turbulência atmosférica. Há quem na Madeira refira a falta de solidariedade da República, a discriminação em relação aos Açores ou mesmo, o ignorar da autonomia regional.

Na verdade, a Madeira e a República têm uma relação mais conflituosa do que aquela entre Açores e a mesma República. Desde os apelos ao independentismo, os estudos do “Deve e Haver” patrocinados pelo Governo Regional, passando pela dificuldade de diálogo institucional, são alguns exemplos ilustrativos.

Esta querela tem-se perpetuado no tempo e parece ser independente dos protagonistas. Existiu com Cavaco Silva e Passos Coelho bem como com José Sócrates e António Costa.

Os Açores preferem usar uma arma de calibre diferente pois, tanto são conciliadores com os Governos da mesma cor partidária, como de cor distinta. Um bom exemplo disso foi a relação mais serena entre Carlos César e Passos Coelho, mesmo nos difíceis tempos da Troika.

A questão verdadeiramente relevante será saber se a Madeira sai a ganhar, ou a perder, optando por uma destas duas abordagens distintas, ou exigir e brigar com a República ou em cooperação e diálogo?

Confesso que tenho algumas dúvidas, tanto que as culpas existirão de parte a parte. Tanto que as intenções dos diferentes governos nem sempre são as mais altruístas. Nem as oposições serão sempre as mais construtivas. Nem o respeito entre as partes impera. Nem todos os cidadãos são tratados de forma igual.

Um dado estatístico parece ser evidente, independentemente de quem governa em Lisboa, os açorianos saem, por norma, a ganhar com a postura transparente e conciliadora. Mais transferências do Estado e processos de decisão mais céleres. Uma Lei da Finanças Regionais mais benévola aos islenhos setentrionais. Uma imagem de sobriedade.

Um dado curioso é que nem as linhas partidárias conseguem escapar a este atrito. Por mais que me esforce, não consigo compreender a razão de Rui Rio mandar os seus deputados votar contra uma proposta que visava aliviar os encargos financeiros das Regiões, em especial nesta altura excecional de pandemia, mesmo quando tal foi pedido pelo seu partido na Madeira. Isto a não ser que Rui Rio tenha um desejo, diria inconfessado, quase pecaminoso, de algum tipo de mudança na Madeira.

Nem muito menos se compreende o atrito criado agora com o Presidente da República, que é certamente alguém que está em posição, se quiser, de nos ajudar ou, em vez, de nos preterir. Perguntar-se-á, quem semeia ventos, não colherá tempestades?

À medida que as ajudas do Lay off forem cessando, mas antes ainda da nossa economia, maioritariamente centrada no turismo, poder retomar a sua pujança, os madeirenses poderão passar por tempos difíceis. Muito difíceis mesmo. Precisaremos de ajuda. Precisaremos de amigos para evitar o desastre económico, o desaparecimento das nossas empresas e o naufrágio social. Precisamos que o triângulo não seja a razão de mais uma tragédia. Precisamos de pragmatismo para navegar em águas turbulentas.

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