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Crónicas

Arranhar o sistema

1. Livro: Ignacio del Valle escreveu “Céus negros” uma estória baseada na realidade do pós-Guerra Civil de Espanha. Excelente e revoltante. Razões políticas retiram, aos seus pais, 30 mil filhos de republicanos que são “reeducados”. Um dos mais repugnantes crimes do franquismo, posto a nu neste romance.

2. Disco: gosto muito de Mazgani. O luso-iraniano faz música que toca cá dentro. Em “The Gambler Song” consegue encontrar-se um cheirinho de Cohen, uma pequena dose de Dylan, um parecer a Cave, um lembrar a Waits e uma coincidência com Berninger. Mas, acima de tudo, muito Mazgani.

3. Tenho um gato. Quer dizer, ainda não percebi bem se “tenho um gato” ou é o gato que me tem a mim. Apareceu assim, de repente, nas nossas vidas. Tem vários nomes e não dá por nenhum. Não está para isso. Para mim, é o Sr. Garfoldo. Não é que ele não oiça pois, como todos os gatos, tem uma audição apuradíssima conseguindo ouvir sons de alta frequência que nós não conseguimos. Faz que não percebe.

É grande e gordo. Como eu. Passa o dia a dormir e nos intervalos come, limpa o pêlo e faz as suas necessidades no sítio certo. É, por isso, um gato extremamente civilizado.

Biologicamente, o cérebro de um gato tem algumas semelhanças com o de um humano. Ambos têm uma região idêntica, no encéfalo, responsável pelas emoções. O que sucedeu connosco, foi que perdemos a habilidade de começar a berrar para a lua quando estamos com o cio e não bufamos, pelo menos a maioria, uns para os outros. Mas vontade, muitas vezes, não nos falta.

Vomitam o que não presta. No caso do Sr. Garfoldo, são bolas de pêlo, bocados de plástico e tronquinhos de segurelha que, sempre que pode, vai buscar a um canteiro da varanda. Ou seja, regurgita porcaria. Fizéssemos nós o mesmo, figurativamente, com as porcarias que não gostamos.

Sempre que vejo um gato, isso remete-me para a política. São, para mim, os mais políticos dos animais. Não sei se o sabem, mas as gatas são maioritariamente de direita e os gatos de esquerda. Uns destros e os outros esquerdinos. O Sr. Garfoldo é esquerdino, mas tenho a certeza que, pelos modos e maneira elitista como olha o mundo, joga no grupo da esquerda caviar.

Os gatos raramente miam uns para os outros. Quando o fazem é para chamar a atenção dos humanos. Entre si os gatos cospem, ronronam e silvam. Como alguns espécimes da Assembleia Legislativa da Madeira.

Lavam-se lambendo o pêlo todo, incluindo a genitália. Como... é melhor ficar por aqui.

O meu gato, como bom felino que é, aterra sempre de pé. Nunca perde a verticalidade e sabe sempre onde está. Pudéssemos todos dizer o mesmo, fazendo jus ao facto de sermos vertebrados. É que anda aí cada um cuja coluna até consegue dar nós.

Fiquem a saber que um gato, quando nos roça com o focinho, o que está a fazer é a marcar território, a assumir a posse. Tem umas glândulas à volta da face que servem para esse fim. Muitos políticos também gostam de marcar terreno. Beijam e abraçam nas campanhas eleitorais, como se viesse aí o fim do mundo. Depois das eleições, diferem dos gatos, porque nunca mais nos ligam.

Os gatos, como qualquer bom político, gostam de festas e esfreganço no lombo. Como qualquer bom político, gostam de ronronar para manifestar a sua satisfação.

Em equivalência humana, o Sr. Garfoldo 38 anos, já se poderia candidatar a Presidente da República. Estaria talhado para isso: adora afecto e que o fotografem. Teria uma enorme vantagem em relação ao actual: pode pegar-se-lhe ao colo. Quanto ao resto, era só uma questão de assessorias.

Um gato não tem clavículas, por isso, consegue entrar em qualquer local em que a sua cabeça também passe. Muitos políticos têm clavículas, mas não têm princípios, o que também lhes permite entrar em qualquer local em que a sua cabeça também passe.

Um conselho: dar a um gato comida humana, pode causar má nutrição e provocar doenças. Também não é aconselhável dar comida de gato aos políticos.

Os gatos suam pelas patas e eu já vi muito político a fazer o mesmo.

Mas há algumas características nos gatos que os afastariam da política: são inteligentes, elegantes e ágeis.

O macho tem pénis com espinhos. Eu não tenho e juro que não sei se há políticos que o tenham porque não ando por aí a ver se assim é.

E, finalmente, como muitos políticos, os gatos, também são associados ao Diabo.

4. O PSD defende eliminação das taxas, nos aeroportos da Madeira e do Porto Santo, como meio de relançar a actividade turística. Pode ser que, de caminho, consigam perceber que é na isenção de taxas às companhias aéreas (que deverão ser suportadas pelo OE) que está o caminho da nossa mobilidade e continuidade territorial. O Iniciativa Liberal apresentou uma proposta nesse sentido nas últimas Eleições Regionais. Houve quem nos chamasse de tontos.

5. E continuam as trapalhadas do desconfinamento. Ninguém ouve ninguém. Eles sabem tudo, nasceram ensinados. Decidem coisas sem as articular umas com as outras, sem dialogar com os “players” em causa, sem qualquer rigor científico. Depois, são as correcções, é o dito por não dito. Se estiveram bem no confinamento (salvo normais erros de quem lida com algo nunca lidado), este desconfinamento conheça a deixar a desejar.

6. “A senhora Deputada Elisa Seixas é irrelevante neste parlamento e, por isso, nem sequer lhe respondo!”, António Lopes da Fonseca, líder do Grupo Parlamentar do CDS/PP na ALRM.

Sou adversário político da Elisa Seixas. Começo assim, porque não tenho nenhuma dúvida de que há reciprocidade em tudo o que vou escrever. Sendo adversários, isso não faz de nós inimigos, nem tão pouco nos tornamos desrespeitosos um para com o outro.

Sou liberal e a Elisa é socialista. Os nossos campos estão muito bem definidos. Não duvido, um momento que seja, de que a deputada do PS não esteja convicta que aquilo em que acredita é o que acha ser o melhor para a Madeira. Não me atrevo a questionar o seu apoio à democracia e à liberdade. Isso, para mim, como credenciais, chega e sobra.

Na vida, todos fazem falta. Ninguém é irrelevante. Nem os Lopes da Fonseca.

O Sr. Deputado do CDS, que não passa de um presunçoso sempre ansioso de mostrar serviço, pensa que é quem decide da relevância, ou da falta dela, dos outros deputados do Parlamento da Madeira.

Ao contrário da figuraça, temos a obrigação de não considerar o líder do Grupo Par(a)lamentar do CDS irrelevante, pois ele é extremamente relevante. É relevante pela arrogância, é relevante pela boçalidade, é relevante pela ignorância, é relevante pela falta de educação e é relevante pela falta de sentido democrático. É relevante, mesmo sendo insignificante.

7. Na crónica anterior, referi uma frase de Rui Barreto em que este se referia ao governo de que faz parte como: “o Grande Governo Regional”.

Voz amiga, e mais avisada que a minha, chamou-me a atenção para o seguinte: o Secretário da Economia, e líder do CDS, quando falou do “grande Governo Regional” estava a referir-se ao tamanho. Tem toda a razão. Com tanto secretário, directores regionais, directores adjuntos, presidentes de Conselho de Administração, vogais, chefes de gabinete, assessores, adjuntos, especialistas técnicos, secretárias, motoristas, etc., o Governo Regional é mesmo GRANDE!

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