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Voltar ao normal?

Vamos voltar ao normal. Reabrir. Dizem...Na antiguidade grega havia uma figura que tinha sido condenada a ver o futuro e a prevê-lo (sempre) correctamente, mas a nunca ser acreditada. Não consigo imaginar nada mais horrível – a capacidade de ver o que aí vem aliada à incapacidade de convencer as pessoas a se prepararem para o pior.

Prometem-nos que “vai ficar tudo bem”. Lamento, não vai. Não vai mesmo.

Esta pandemia deixou-nos mais pobres. Mas não nos tirou só meios financeiros (o que já seria bastante mau), retirou-nos também uma certa ingenuidade e boa-fé, no sentido em que muitos de nós acreditavam numa época de (maior) prosperidade comum e de uma certa paz no sistema.

O que esta pandemia nos mostrou é que as assimetrias continuam a existir. E que não é verdade que “estamos todos no mesmo barco”. Quanto muito, estamos todos na mesma tempestade, como dizia alguém sabiamente no Facebook...

Vamos reabrir – dizem. Parece-me prematuro. Não só porque ainda subsistem muitas incertezas como também – pelo menos para já – nos faltam clientes. Os nossos mercados tradicionais permanecerão encerrados pelo menos mais alguns meses, e quando reabrirem vai ser com muitas recomendações de atenção e cuidados, e de preferência não saiam do país (exactamente a mesma mensagem que se fez passar em Portugal).

Acredito que na primavera de 2021 as coisas regressem a uma situação próxima do statu quo ante. E digo próxima porque acredito que para “forçar” uma reabertura as empresas nos destinos vão sofrer pressões terríveis por partes dos operadores no sentido de baixar preços, e de “partilhar” os custos da retoma.

Mas já notaram certamente que somos sempre convidados a partilhar os custos, mas raramente nos chamam para partilhar os lucros?

Vamos reabrir – acredito. Mas estou convicto que vamos abrir com preços mais baixos, o que é um erro estratégico a médio/longo prazo, e que impedirá uma requalificação séria do destino, e que reabriremos com muito menos visitantes, uma quase inevitabilidade, com ou sem preços mais baixos.

Prevejo tempos muito difíceis, particularmente para aqueles que, como eu, dependem da actividade turística na Madeira. E vão ser especialmente difíceis porque mais uma vez fomos incapazes de aprender com a História, e mais uma vez caímos na conversa da monocultura.

E porque continuamos com este sector, que todos apontam como estratégico, na mão de amadores bem-intencionados (não chega...), de vendedores de receita única ou de gestores de outros sectores (construção civil e obras públicas...) que precisam do turismo como instrumento de alavancagem do seu sector base, mas que não têm nem conhecimento nem sentimento para o turismo. Faltam, como sempre, os operacionais que têm o conhecimento e tarimba de anos de actividade. E neste sentido estaremos sempre condenados.

Vamos reabrir. Boa sorte para todos. Porque neste momento, é acima de tudo disso que dependemos...

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