Testes a doentes antes de cirurgias obrigam a mudança de planos
A pandemia de covid-19 obrigou hospitais a procedimentos como testes de despistagem a doentes antes de cirurgias, o que atrasa o ritmo operatório e às vezes obriga a mudança de planos de última hora.
O relato foi feito à agência Lusa por Luís Campos Pinheiro, que dirige o serviço de urologia do Hospital de São José, integrado no Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC), onde foram adotados vários novos procedimentos.
“Mesmo num serviço de urologia que não está dirigido para a covid-19, alterámos muitos procedimentos, designadamente fazer o teste a todos os doentes que são operados”, disse o urologista.
Mas o facto de o resultado do teste à covid-19, doença causada pelo novo coronavírus (SARS-Cov-2), demorar cinco, seis ou mais horas “complica muito” o ritmo operatório, uma situação que se agrava quando dá positivo. Campos Pinheiro contou o caso de um doente que ia fazer uma cistectomia, “uma grande cirurgia” para retirar a bexiga, e que “testou positivo”.
A partir do momento em que se soube que era positivo, foram feitas “todas as diligências” para o isolar e para identificar os profissionais que tinham estado em contacto com o doente.
“A partir dessa hora tentamos arranjar doentes para ocupar a sala operatória”, que chegaram ao hospital quatro horas depois, cerca das 22:00, e tiveram de fazer teste o que obrigou a esperar mais horas.
“Isto complica muito a orgânica do hospital e, portanto, é evidente que o ritmo operatório com os doentes está diferente”, uma situação que preocupa médicos e doentes.
O médico explicou que nas situações em que o teste dá positivo deve ser protelada a cirurgia, mas se o caso for urgente o doente é operado no hospital Curry Cabral, que pertence ao CHULC e tem “as condições mais adequadas” para estes doentes.
O especialista disse também recear que o medo de contrair covid-19 esteja a afastar as pessoas dos serviços de urgência e que isso venha a agravar as doenças.
Deu o exemplo de um jovem de 20 anos que teve “uma torção do testículo, uma dor súbita intensa”, uma situação que deve ser operada num espaço inferior a seis horas.
“Como não queria ir ao hospital com receio da doença e como a linha Saúde 24 não estava a atender, ele chegou ao hospital já com 20 horas de início da sintomatologia e acabou por perder o testículo”, contou, lembrando que apesar de em termos da vida sexual e reprodutiva não alterar nada, é um “grande drama psicológico” para um jovem.
Como em todas as especialidades, a urologia também tem falsas urgências, mas as cirurgias eram “situações verdadeiras e essas também desapareceram”.
“Está toda a gente surpreendida, onde estão estes doentes? As doenças não se modificaram com o início desta crise e temos receio que os doentes venham a chegar mais graves, mas a verdade é que isso ainda não está a acontecer”, frisou.
Contudo, “as urgências estão com um movimento muito, muito baixo e o hospital está com muitas camas vagas”.
“Estou convencido que esta nossa perceção de que o SNS no seu conjunto é importante para todos, e não apenas para as pessoas com menos posses, vai ajudar o SNS na sua organização geral, nos próprios profissionais que hoje têm orgulho de ser do SNS e que há seis meses não tinham”, concluiu.