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Crónicas

O bom, o mau e o improvável

De repente, o PS local contempla um candidato improvável à liderança. Quanto a Carlos Pereira, deve estar arrependido de ter ido ao lançamento da candidatura de Cafôfo

Na semana em que o barril que guarda o petróleo, foi mais caro do que o petróleo que estava lá dentro, o preço da gasolina continua a desafiar a lógica. Imagine que a gasolina era vendida a 0 euros. Para facilitar, esqueça os custos associados à venda de combustível. Agora adicione o imposto sobre produtos petrolíferos (ISP). Junte também o adicional ao ISP. De seguida, acrescente a contribuição para o serviço rodoviário e a taxa de carbono. Não se esqueça, todas estas taxas são fixas, ou seja, não variam com o preço do combustível. Por fim, sobre este valor salpique o IVA a 22%. E assim, num truque de magia fiscal, o Estado cobrou-lhe quase 80 cêntimos por cada litro de gasolina oferecido. Há prendas que saem caras.

O Bom: Câmara de Lobos

A vida nunca foi fácil em Câmara de Lobos. Ali, onde a pobreza se escondia nas furnas do Ilhéu, onde os meninos das caixinhas eram mão de obra dos pais e a droga um destino natural para ambos. Quem hoje visita Câmara de Lobos, não pode imaginar as provações por que aquela terra passou. Agora que o Ilhéu virou restaurante, aquela passou a ser a cidade do Teatro Metaphora, das ruas enfeitadas com latas recicladas ou do hotel que encontrou o nome em Churchill. Câmara de Lobos mudou, mas o passado persiste, indelével, em quem lá vive. Talvez por isso sejam gente áspera mas genuína, alegre ainda que melancólica. Todos profundamente orgulhosos da sua terra. Não há cerca que os derrube. Mas também não há cerca que explique a ignorância de quem tentou transformar Câmara de Lobos numa terra maldita. Principalmente, porque o vírus é cego à geografia e a redoma que hoje guarda Câmara de Lobos pode cercar outra cidade amanhã. O que torna a polémica com o transporte dos infetados para o Cabo Girão ainda mais difícil de compreender. Difícil, porque vem de dentro do concelho e por isso é, especialmente, fratricida. Mas até nas horas mais negras, há quem não vire as costas a quem precisa. Merece reconhecimento, o Presidente da Câmara, Pedro Coelho, que foi ao Cabo Girão dar a cara por uma decisão difícil e voz a quem, naquele momento, não a tinha. Fez o que muitos teriam encomendado a um assessor. Para os amigos e colegas de trabalho dentro da cerca, e para todos os que vivem em Câmara de Lobos, um abraço.

O Mau: Ferro Rodrigues

Encontrar uma alcunha para Ferro Rodrigues é uma tarefa difícil, pois há o sério risco de ficar aquém da gravidade da personagem. Na discussão sobre a celebração do 25 de Abril, Ferro Rodrigues é o festeiro-mor e, por isso, a medida do distanciamento entre a política e a sociedade. A primeira preocupada com festas e a segunda com a recuperação do país. Para além de inútil, a discussão sobre as comemorações parte de vários equívocos. Em primeiro lugar, que quem critica esta forma de celebração é um perigoso fascista e tem um desejo secreto de voltar ao Estado Novo. Entre estes inimigos da liberdade encontram-se João Soares, Miguel Sousa Tavares e Vasco Lourenço. Tudo gente que abomina a revolução. O segundo equívoco, é que não há outra forma de celebrar o 25 de Abril. Tem de ser na Assembleia da República, com os convidados de sempre, com os discursos de sempre, que cheiram mais a mofo do que a liberdade, ou então, nada feito. É uma espécie de mandamento revolucionário. Não podiam estar mais errados. Depois de ver o Papa Francisco a celebrar missa perante uma praça vazia e de sentir o impacto que essa imagem teve no mundo, é óbvio que esta era a oportunidade para reinventar a forma como se festeja Abril. Não é comparar religião com política, mas apenas constatar quem está disposto a mudar e quem vive agarrado ao passado. Afinal, a esquerda portuguesa nacionalizou para si o 25 de Abril, com o beneplácito do centro e da direita. Agora a revolução tem proprietários. Um deles é Ferro Rodrigues, que acha que usar máscara é brincar aos mascarados. Num país normal seria alvo de vergonha coletiva, por cá é a 2ª figura do Estado.

O improvável: Carlos Pereira

O pântano alagou o Partido Socialista local. Em plena pandemia, não se conhece rumo aos socialistas do burgo. Emanuel Câmara, o presidente em função, desapareceu do panorama político. Fê-lo muito antes do vírus e por razões que ninguém explicou. Paulo Cafôfo, o presidente anunciado, parece peixe fora de água em ambiente parlamentar. Dividido entre a crítica frontal ao Governo ou a manutenção de uma imagem pública imaculada, acaba perdido entre uma e outra. Entretanto, o partido que esperava, sem pressa, pelo seu congresso, agora desespera para que ele se realize. Mas no meio do pântano socialista, há quem faça o seu próprio caminho, imune ao desnorte local. Carlos Pereira destacou-se no marasmo que o rodeia. Quando falou no corte das PPP regionais, quando defendeu a suspensão da Lei das Finanças Regionais ou até quando propôs medidas contra o encerramento de empresas na Região. Fê-lo com a competência que lhe é reconhecida e resistiu à tentação de divagar sobre testes e máscaras. De repente, o PS local contempla um candidato improvável à liderança. Quanto a Carlos Pereira, deve estar arrependido de ter ido ao lançamento da candidatura de Cafôfo. Esse foi um erro que Emanuel Câmara não cometeu.

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