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Cáritas lança apoios de resposta à pandemia de 130 mil euros

Foto CESAR MANSO / AFP
Foto CESAR MANSO / AFP

A Cáritas Portuguesa lança hoje apoios de 130 mil euros, insuficientes à partida, para responder a milhares de pedidos de ajuda vindos também dos “novos pobres” da pandemia, uma classe média que, sem ajuda, se transformará em pobreza estrutural.

As contas do presidente da Cáritas Portuguesa, Eugénio Fonseca, que ainda não tem um balanço estruturado e definitivo dos novos pedidos, apontam para uma média de 150 novas famílias apoiadas em cada Cáritas Diocesana, que tem 20 postos de atendimento pelo país, o que, contas feitas, duplica o número de atendimentos e dará cerca de três mil novos pedidos de ajuda provocados pela pandemia.

“Uma gota”, garante Eugénio Fonseca. Até dentro do universo Cáritas. De fora destas contas ficam os atendimentos paroquiais, “onde vai muito mais gente” – são 4.350 paróquias e “metade estão a ser procuradas”.

Perante isto, o próprio presidente da Cáritas Portuguesa reconhece que o mais certo é não passar de “um sonho” o objetivo de fazer chegar a junho os 130 mil euros em novos apoios, traduzidos em ajuda alimentar e outras necessidades básicas, como água, luz, eletricidade ou gás, e, realidade que já vem da crise anterior, apoio ao pagamento de rendas de casa.

“Estes 130 mil euros são fundos que a Cáritas tinha reservados para situações de emergências e são totalmente aplicados. Estes fundos não resultaram de dádivas recentes. Estou convencido que dada a situação dramática que já se está a sentir que não vamos chegar a junho sem esgotar”, disse à Lusa.

Os 130 mil euros dividem-se em 100 mil para apoio alimentar e 30 mil para que as pessoas possam também continuar a assumir compromissos que são imprescindíveis”, como as rendas e os serviços de energia e água.

“Estamos convencidos que não vai resolver. Esperamos chegar a perto de duas mil pessoas, mas muitas outras com certeza ficarão de fora. Não conseguimos acudir a tudo, há outras instituições a trabalhar bem e é na cooperação entre todos que se pode atenuar o problema”, disse Eugénio Fonseca, que adiantou também que a instituição mantém em funcionamento todas as respostas e apoios que já existiam antes do novo contexto da pandemia.

Os pedidos de ajuda chegam de cinco grupos bem identificados: os mais idosos, as famílias mais vulneráveis, como as monoparentais ou as muito numerosas – com implicações em situações futuras de pobreza infantil – ex-reclusos e suas famílias, sem-abrigo e migrantes.

Em relação aos sem-abrigo, por exemplo, uma das Cáritas Diocesanas está neste momento a apoiar mais 100 pessoas nessa situação, a juntar-se aos que já eram apoiados, sendo necessário encontrar espaços alternativos para alojamento.

A principal causa da procura de ajuda desta crise é a de todas as outras. O desemprego ou a perda de rendimentos provocada por situações como o ‘lay-off’ levam a muitas novas necessidades de assistência.

É aqui que se inserem boa parte dos pedidos de ajuda, os “novos pobres”, oriundos de uma classe média-baixa ou média-média, para os quais Eugénio Fonseca diz ser necessária uma “intervenção devidamente planeada” pelo Estado que os retire rapidamente da situação de privação e evite “problemas de saúde mental e situações de desespero, de desânimo e de desistência”.

“Quando se desiste, então sim, corre-se o risco de se ficar na pobreza estrutural”, disse.

A ajuda vai chegar em forma de ‘ticket restaurante’, uma modalidade selecionada por concurso público, que não obriga a pagamentos de comissões, e que não identifica a Cáritas como a origem do “dinheiro” a usar em supermercados e mercearias, na compra de bens essenciais, que não têm que ser necessariamente alimentares, podendo passar por bens de higiene.

Aceder aos ‘tickets’ seguintes vai obrigar a mostrar a quem está no atendimento social os talões das compras nos supermercados para “provar que não há bens adquiridos que efetivamente não sejam bens de primeira necessidade”, o que será “devidamente controlado”.

Utilizar um método de pagamento que não identifica a Cáritas e que está bastante generalizado como forma de pagamento de subsídios de refeição pelas empresas evita que a estas pessoas fique associado qualquer tipo de estigma, a que “não sintam vergonha nem se sintam discriminadas na caixa do supermercado”, “assegura-lhes dignidade” e autoestima, até porque se deixa nas suas mãos tarefas diárias de compras e planeamento de refeições, que ajudam a manter uma ocupação diária.

Eugénio Fonseca elogia as medidas de proteção tomadas até agora pelo Governo, que se cruzam diretamente com as ajudas prestadas pela Cáritas, no pagamento de serviços e rendas, mas diz que é preciso mais e defende um plano de contingência social nacional, que programe apoios, que defina uma estratégia de reintegração das pessoas no mercado de trabalho e que envolva o Governo e “organizações intermédias da sociedade civil”.

Aqui cabem as instituições particulares de solidariedade social (IPSS), mas também coletividades e “organizações informais de proximidade”.

“Todos agora somos chamados a dar este contributo, porque, como percebemos com a contingência sanitária, quando nos unimos atingimos resultados mais rápidos. Isto também se passa ao nível da pobreza”, disse.

A coordenação do plano devia, segundo o presidente da Cáritas Portuguesa, ficar a cargo da Presidência do Conselho de Ministros, uma vez que há mais dimensões governativas que devem ser incluídas neste plano para lá do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: a Economia para o relançamento da atividade económica, as Finanças para acautelar questões orçamentais, a Educação e até a Justiça.

“Pode haver situações em que os direitos dos trabalhadores estejam a ser lesados por oportunismos das entidades empregadoras e é preciso acelerar. A nossa justiça nestas coisas não pode ser tão vagarosa como tem sido”, defendeu.

Eugénio Fonseca sugere também ao Governo um trabalho próximo com as instituições que lidam diariamente com a realidade da pobreza para a criação de um barómetro social, ainda que reconheça que é uma ideia que “politicamente não interessa, porque não fica bem a um país dizer que tem uma taxa de risco de pobreza dois ou três pontos acima do seu espaço de união política, que é a União Europeia”.

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