Sociedade Portuguesa de Transplantação alerta para “lado oculto” da Covid-19
“Nunca nos tempos modernos a medicina atravessou uma época como esta”. A frase pertence à Sociedade Portuguesa de Transplantação (SPT) que faz uma reflexão sobre a Covid-19 através de uma carta aberta onde alerta para “os danos colaterais nos doentes que têm a infelicidade de ser acometidos por eventos de saúde agudos ou portadores de doenças crónicas”, neste caso específico, os doentes transplantados ou à espera de transplante.
“Nenhum serviço de saúde está preparado para uma situação destas e, por isso, é importante tomar medidas precoces e infelizmente aprender com os países que sofreram primeiro as consequências desta pandemia”, refere a SPT confirmando a existência de “unidades de referência de excelência”, que nos colocam “na linha da frente na doação e na transplantação”. Por isso, é importante que os hospitais, mesmo que de primeira linha no combate à infecção por coronavírus e que integram Unidades de Transplantação, “sejam capazes de se organizar para manter níveis de assistência a este grupo de doentes de risco acrescido devido à terapêutica imunossupressora”.
Para reduzir os riscos de infecção e com o objectivo de manter a assistência a estes doentes, a SPT advoga algumas medidas, de acordo com as orientações das Sociedades Internacionais:
- Organizar as consultas de seguimento em doentes estáveis, privilegiando o atendimento não presencial e com contacto telefónico;
- Estabelecer circuitos hospitalares alternativos aos circuitos de doentes COVID, para doentes transplantados com intercorrências agudas e que necessitem de avaliação presencial;
- Programar as colheitas de análises em locais dedicados a nível hospitalar ou através de protocolos com laboratórios periféricos e próximos das áreas de residência;
- Programar o fornecimento de medicação hospitalar em horários restritos ou por marcação direta com os serviços farmacêuticos ou mesmo através de entrega ao domicílio e alargando os intervalos de entrega;
- Manter asseguradas, nos internamentos destes doentes, as coberturas médicas e cirúrgicas para as intercorrências agudas e para os transplantes urgentes que neste período possam vir a ocorrer.
Estas medidas devem ser implementadas e transmitidas aos doentes de forma clara, assegura a SPT que não tem dúvidas de que, passada esta era da Covid-19 que agora enfrentamos, haverá a diminuição de sinalização de “potenciais dadores”, algo que vai prejudicar os doentes que esperam por um transplante de órgãos vitais, como fígado, coração e eventualmente pulmão.
“As directivas internacionais baseadas nas experiências de epidemias prévias como a gripe A ou a gripe das aves aconselham que o transplante considerado urgente deve manter-se, pesando o risco de vida do doente e avaliando caso a caso. Este também foi o entendimento do Instituto Português de Sangue e Transplantação e com o qual concordamos”, lê-se no documento.
Por fim, a SPT recorda que, se é verdade que se “morre por infecção com Covid-19, também se morre por falta de órgãos vitais”, sendo certo que quando esta situação for ultrapassada, “perceberemos o que neste momento se encontra oculto pela voracidade dos números diários dos doentes infectados ou de perdas de vida por infecção Covid-19. Saberemos os números dos falecimentos, provavelmente subestimados, dos outros doentes que continuam a existir”.