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Os Pais, os Filhos e o Futuro

Vamos ter de mudar hábitos, vamos de ter outros cuidados, pelo menos até haver uma vacina

Todas as famílias passam por um tempo difícil, e não faltará também a necessidade de revisitar o passado, as memórias, e os afectos que neste momento não são possíveis. Passámos nestas semanas pelo Dia do Pai, Dia dos Filhos e pela tradicional Páscoa. Entes queridos separados, amigos à distância, relações alteradas pelo confinamento obrigatório que temos de ultrapassar. E temos tempo para refletir sobre aquilo que nos marcou e marca.

E relembro a pessoa do meu pai como sendo extraordinariamente optimista. De uma geração nascida a meio do século passado, no pós grande guerra, passaram pela gripe asiática, a guerra Colonial, o final doloroso do regime fascista, pela perseguição política, a tortura e prisão, pela crise petrolífera dos anos 70, pelo 25 de abril, os inúmeros conflitos mundiais da década de 80 e 90, mas também a adesão à Comunidade Europeia, a queda do Muro de Berlim, a internet, o início da globalização, e também a crise do subprime e das dívidas soberanas há uma década. Ainda não tinham visto o seu País, a Europa e o Mundo totalmente paralisados, mas viram o suficiente para perceber que vamos conseguir dar a volta, recuperar, viver novamente com alegria, e prosperar.

Nos últimos dias, com a evolução mais favorável da propagação do vírus, diminuindo substancialmente o crescimento do número de novos casos (no País e em particular na Região), e com a maioria das famílias a começar a acusar a fadiga do confinamento, começam a surgir igualmente cada vez exigências para que se defina um plano de retoma pós-estado de emergência. As empresas nos diversos sectores estão a entrar num período crítico em que faltarão as reservas financeiras para aguentarem a sua atividade, e tendo em conta o peso do sector do turismo na Região, e o número de pessoas que dependem direta ou indiretamente do mesmo, as perspetivas económicas e sociais são profundamente negativas e obrigam-nos a refletir muito bem sobre as medidas a tomar, sendo que me parece consensual que tudo deverá ser feito de uma forma gradual e controlada.

No entretanto o Governo da República já duplicou o valor das linhas de crédito de apoio às empresas, passando de 3 mil para 6,2 mil milhões de euros, e abrangendo agora centenas de outras atividades que não estavam incluídas, nomeadamente nos serviços, agricultura e construção, sectores fundamentais na Madeira e que podem ter acesso a este apoio nacional. As dificuldades estão a agravar-se.

Um ponto que julgo ser importante sublinhar é que ainda não chegou a altura de baixar a guarda no que concerne às medidas de salvaguarda sanitária. As indicações dadas pelas autoridades de saúde têm cada vez mais vindo a destacar esta necessidade, e é particularmente importante que os cidadãos continuem a cumprir com o confinamento de modo a que não haja uma recaída de contágios que se possa descontrolar. Seria o pior que podia acontecer, socialmente e economicamente.

Dito isto, é preciso planear, preparar, consciencializar, para que todos os cidadãos estejam efetivamente bem informados e com as condições necessárias para cumprir com as normas que serão necessárias para podermos conviver novamente em comunidade, quando assim for decidido.

O Governo da República já deu o primeiro passo com a decisão do regresso às aulas do 3º período, e com aulas presenciais apenas para o 11º e 12º ano se as condições sanitárias o permitirem. A telescola ou estudo em casa será feito para o ensino básico, entre o 1º e 9º ano, com ensino à distância para o secundário. Haverá igualmente conteúdos específicos na televisão para o pré-escolar. À hora que escrevo este texto o Governo Regional ainda não anunciou as eventuais especificidades na Madeira, mas presumimos que sejam na mesma linha, com o apoio da RTP Madeira.

Quanto ao regresso generalizado das pessoas e empresas ao trabalho, antes de mais julgo que o Presidente do Governo Regional deveria consultar as forças políticas representadas na ALRAM e os parceiros sociais, antes de tomar decisões definitivas, de modo a que sejam realizadas no maior consenso possível, e que sejamos todos corresponsáveis pelas mesmas. Tem de haver uma equidade no tratamento dos diversos sectores de atividade, de modo a evitar situações injustificáveis ou incompreendidas. Tem de estar salvaguardadas condições de higiene e segurança no trabalho, tem de haver regras bem estabelecidas para que possamos todos cumprir sem colocar em causa a saúde pública.

Independentemente de tudo, há uma medida já tomada pelo Governo Regional que me parece fundamental, que foi a encomenda de 250 mil máscaras para distribuição generalizada à população, devendo o seu uso ser obrigatório. A proteção e a responsabilidade individual é a ação mais importante que podemos tomar no pós confinamento. Precisamos também de testar continuamente a população, sendo que somos uma das regiões com menos testes realizados até ao momento.

Vamos ter de mudar hábitos, vamos de ter outros cuidados, pelo menos até haver uma vacina ou um tratamento que nos possibilite lidar com este vírus de uma forma adequada sem colocar novamente em causa toda a nossa vivência em sociedade. Vai demorar tempo, vão haver muitos problemas sociais no curto prazo, muitas falências, muito desemprego, e será necessária muita ajuda estatal. Tenho esperança e moderado otimismo que conseguiremos ultrapassar as dificuldades, como sempre os nossos pais fizeram.

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