>
Crónicas

O vendedor de banha da cobra

Usam e abusam por isso, das novas tecnologias, para criar mitos e ilusões que facilmente conseguem sustentar

Não sou do tempo em que as feiras e os vendedores ambulantes proliferavam pelo Mundo. Não conheço por isso in loco os originais que palmilhavam estradas e caminhos com o seu inigualável dom da oratória, que subiam com facilidade a bancos ou palcos improvisados para dissertarem sobre produtos que não eram mais do que uma mescla de líquidos sem qualquer teor cientifico, fundamentados pela mentira e pela invenção, de quem tentava a todo o custo indrominar os mais incautos. Na altura a informação era escassa e pouco acessível. Não existia um Google para nos tirar todas as dúvidas e mais algumas e para além disso a própria medicina estaria ainda pouco avançada e competia ferozmente com tudo o que eram mezinhas e produtos de origem duvidosa que prometiam absoluta eficácia, a cura para todos os males e enfermidades, miraculosamente infalíveis.

Mas estes personagens ao contrário do que muita gente possa imaginar, não nasceram no teatro, nem nos livros ou em qualquer história de ficção. Eram reais, existiam por aí, apareciam com sacos pretos pejados de frascos e frasquinhos, quase como se de magia se tratasse e aproveitavam-se logicamente dos mais desesperados, doentes e necessitados. A estratégia era sempre a mesma. Bem falantes, com voz vigorosa e eloquente, afirmavam já ter testado os produtos aqui e ali, com comprovados benefícios, que tratavam de tudo e mais um pouco. Usavam a estratégia da vitimização assumindo-se como honestos e perseguidos por terem encontrado a fórmula secreta e afirmavam-se pela sua astúcia. Tinham a capacidade única de com um simples olhar perceberem quem se encontrava mais fragilizado e atacavam a “presa” de uma forma avassaladora quando sentiam a sua hesitação. E havia sempre quem cedesse à tentação e comprasse os divinos produtos.

Na verdade esses vendedores não desapareceram. E se antigamente eram sustentados pela falta de conhecimento hoje em dia são mais hábeis, perigosos e meticulosos. Já não vendem banha da cobra mas continuam a socorrer-se das mais variadas artimanhas para enganar e ludibriar quem com eles se cruzem no caminho e lhes dêem a mínima oportunidade. São por esta altura inovadores e criativos levando-nos a acreditar, quando nos achamos preparados para qualquer tipo de estratégia de marketing e comunicação. Quando pensamos que já vimos tudo lá aparecem eles com uma ideia nova, revolucionária que normalmente promete fortuna e saúde lá para o futuro mas vai corroendo os bolsos dos mais inocentes. Bem apresentados , normalmente “montados” em bons carros e com a facilidade de usarem as redes sociais para promover aquilo que não têm mas que aparentam ter, dando sempre aquele ar de bem sucedidos.

É vê-los em viagens e festas que geram uma inveja muitas vezes acima de qualquer suspeita. Usam e abusam por isso, das novas tecnologias, para criar mitos e ilusões que facilmente conseguem sustentar. Exemplares artesãos da falsidade e da pantomineirice, são peritos em criar expectativas e em conseguir aguentar a mentira mesmo perante evidências. A sua zona de conforto é a das palavras, normalmente com poucas provas dadas mas capazes de ensinar o caminho para a felicidade sem o mínimo esforço. Exibem-se como exemplares de luxo de uma fina estirpe mas na realidade não passam de reles aldrabões que mais cedo ou mais tarde são desmascarados tendo que fugir como antigamente e ir pregar para “outra freguesia”. Aí encontrarão mais uns inocentes, as novas vítimas prontas a ser enroladas sempre com a mesma estratégia. Desviam-se das consequências e utilizam a sua falsa índole sem quaisquer complexos ou complacências. Todos nós conhecemos esta laia de parasitas que nos atrasam a vida e nos “comem” a comida sem apelo nem agravo. Só que muitas vezes não o admitimos pela vergonha de termos sido enganados de forma aparentemente tão fácil. Mas eles andam aí. Sempre com uma nova história por contar e um novo projecto para apresentar...

“Pode-se enganar alguns o tempo todo e a todos por algum tempo, mas não se pode enganar a todos o tempo todo...”

Abraham Lincoln

Fechar Menu