Agentes culturais subscrevem ‘Manifesto em Defesa de um Presente com Futuro’
Protagonistas das artes e das letras subscrevem hoje um “Manifesto em Defesa de um Presente com Futuro” na Cultura, que dirigem ao Governo, entre outras entidades públicas e privadas, no contexto da paralisação resultante do combate à covid-19.
“Vimos solicitar ao Governo, às regiões autónomas, aos municípios, aos bancos, às empresas, às fundações, que assumam iniciativas para que Portugal e o seu sistema cultural não se diminuam de forma drástica. (...) Queremos e precisamos de construir Portugal para lá do medo”, lê-se no Manifesto subscrito por três dezenas de criadores, que surge na edição de hoje do jornal Público.
A contratação de agentes culturais, a constituição de fundos para aquisição de obras, segurar salários e criar linhas de apoio a projetos culturais estão entre as quase duas dezenas de iniciativas propostas pelos subscritores do manifesto.
Os professores e ensaístas Isabel Pires de Lima e Jorge Barreto Xavier, que já assumiram a pasta da Cultura em governos anteriores, o ilustrador André Letria, os músicos Camané, Pedro Abrunhosa e Rita Redshoes, os escritores Frederico Lourenço e Lídia Jorge, as coreógrafas Clara Andermatt, Filipa Francisco e Olga Roriz, o arquiteto Gonçalo Byrne, os artistas plásticos Bela Silva, Emília Nadal, Joana Vasconcelos e Vítor Pomar estão entre as 32 personalidades que assinam o manifesto.
“Precisamos de proteger as condições de trabalho da comunidade cultural pois ela (...) é um fator de estímulo e desenvolvimento da criatividade individual e coletiva, do pluralismo das linguagens e dos comportamentos, de valorização e sustento da democracia”, defendem os subscritores. É através da Cultura que indivíduos se transformam “em pessoas e grupos em comunidades”.
A “contratação de agentes culturais por parte do Estado, das regiões autónomas e das autarquias para novas encomendas e prestações de serviço, cujo resultado será mostrado no período pós-covid-19 ou, em formato ‘online’, durante este período” abre a lista de propostas, que inclui também o “desenvolvimento de programas de formação ‘online’, com bolsas de formação associadas”.
Fundos de aquisição de obras de arte, de composições musicais, peças teatrais e coreográficas, fundos para a aquisição de projetos de design gráfico e industrial, a constituição de bolsas de criação literária estão também entre as propostas do manifesto.
A estas juntam-se programas de encomendas de linhas editoriais e de aquisição de livros e revistas, a editores e livreiros.
Para pequenas e médias empresas culturais, é proposta a criação de empréstimos sem juros, de amortização longa.
Encomendas de filmes e documentários, de arquitetura para espaços públicos e privados, encomendas para design de comunicação e de equipamento juntam-se ao rol, que inclui ainda a proposta de apoio ao arrendamento de pequenas e médias empresas culturais, a constituição de seguros de salários e apoios a fundo perdido para montagem de novos projetos com apresentação ‘online’.
O pagamento a horas ou antecipado de apoios às artes já contratados é também defendida pelos subscritores.
“Estas e outras medidas devem ser, desejavelmente, cumulativas. A não decisão ou a decisão lenta terá custos muito elevados -- é preciso agir, e depressa”, escrevem.
E alertam: “A ausência destes investimentos gerará desemprego, falências, incumprimentos contratuais e toda uma série de custos económicos e sociais cujo impacto será similar ou maior ao investimento financeiro e operacional que deve ser feito, agora”.
“A quebra brusca da atividade cultural em todo o território nacional é desastrosa para todas as profissões que se exercem neste domínio. Dezenas de milhar de famílias estão em risco grave de empobrecimento, milhares de empregos podem perder-se, atividades sedimentadas e projetos novos podem terminar”, escrevem.
“A recuperação a partir de uma situação de destruição será muito lenta e difícil”, e haverá património perdido para sempre, com sacrifício da diferenciação e identificação de Portugal, como parte de um mundo plural, alertam.
“O custo cultural será evidente: o desaparecimento ou grave debilitação do tecido cultural português corresponderá à predação do território nacional pelo ‘mainstream’ do ‘entertainment’ global, através das grandes plataformas, e ao derrubar das conquistas frágeis alcançadas para um sistema cultural nos últimos 46 anos, correspondentes ao pós-25 de Abril”.
“Não podemos deixar que tal aconteça. São precisas medidas rápidas (...) Cada instituição tem de assumir as suas responsabilidades próprias. Não há tempo para jogos políticos menores ou falta de ética. E a articulação dos diversos agentes referidos, a sua coordenação solidária, será valiosa para enfrentar o mal que nos assola”, alerta o manifesto.
“Lemos e lemo-nos através das artes e do património cultural, da literatura e dos museus, do design e dos arquivos. Lemos e lemo-nos pelas múltiplas formas que, ao longo das nossas vidas, tudo o que nos rodeia ganha sentidos”, através de artistas, escritores, criadores, editores, investigadores e todos os agentes que garantem a atividade cultural.
Os professores e investigadores Alexandre Cortez Pinto, Carlos Antunes e Carlos Pimenta, os atores Dalila Carmo e Luís Vicente, o músico e gestor Tózé Brito, o responsável da Associação para a Gestão e Distribuição de Direitos Miguel Carretas, o galerista Nuno Centeno, o jornalista Manuel Falcão, a presidente da Fundação José Saramago, Pilar del Rio, a historiadora Simonetta Luz Afonso, ex-diretora-geral do antigo Instituto Português de Museus e o responsável pela gestão da associação Gerador, Tiago Sigorelho, são outros subscritores do Manifesto.