Vladimir Putin, o líder que há 20 anos prometeu reerguer a Rússia
O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, prepara-se para garantir um quinto e sexto mandato e assumir a chefia do Estado até 2036, uma inédita longevidade política iniciada há 20 anos quando venceu as presidenciais após a resignação de Boris Ieltsin.
Em 26 de março de 2000, o ex-primeiro-ministro Vladimir Putin -- designado seu sucessor por Boris Ieltsin após a sua inesperada renúncia ao cargo em dezembro de 1999 --, foi eleito na primeira volta das presidenciais antecipadas com 53% dos votos.
De imediato, o novo líder do Kremlin anunciou os seus objetivos prioritários a nível político: reforço da eficácia do Estado russo a nível interno e no plano internacional e o fim com um período longo de turbulências internas, dolorosas para a maioria da população.
A subida ao poder de Putin, então apenas com 47 anos, coincidirá com um período de recuperação económica e de crescimento, em grande medida motivado pelo aumento dos preços do petróleo, sendo a Rússia um dos principais produtores e exportadores mundiais.
Putin foi assim associado ao fim do período de profunda depressão que se seguiu ao fim do regime soviético com a dissolução da URSS e a aplicação de uma “terapia de choque” que transformou de forma decisiva as relações sociais, hábitos de vida, sistema político e valores.
Na época pós-soviética, como têm sublinhado diversos analistas da política russa, emergiu uma classe de proprietários de grandes empresas, industriais, sociedades financeiras e comerciais, enquanto o sistema político assumia a forma de um regime presidencial, com a maioria dos poderes concentrados no chefe de Estado, uma herança que Putin recebeu do seu antecessor.
Ex-funcionário dos serviços secretos soviéticos, Putin procedeu a uma nova repartição das riquezas e da influência entre a oligarquia e as antigas elites do regime soviético, em particular os serviços de segurança e burocracia. E tentou um equilíbrio entre as tendências neoliberais e intervencionistas, integrando-as no aparelho de Estado.
Este período de crescimento foi assinalado por uma duplicação do PIB e um aumento do nível de vida que lhe reforçou a popularidade -- incluindo com o aumento das pensões de reforma e outros benefícios sociais --, um otimismo interrompido com a crise financeira de 2008-2009.
Apesar de uma recuperação entre 2010 e 2012, os últimos anos voltaram a registar um recuo do PIB e as perspetivas de estagnação da economia do país, também assolado a partir de 2014 pelas sanções ocidentais motivadas pela anexação da península da Crimeia e o apoio à rebelião separatista no leste da Ucrânia.
A partir de 2007, e para além da necessidade de reformular uma economia demasiado dependente dos hidrocarbonetos e combater o “flagelo da corrupção”, Putin decidiu eleger a questão demográfica como “o problema mais grave da Rússia moderna”,
No final de 2016, um relatório elaborado pelo Serviço federal russo de estatística (Rosstat) revelava que 4,5 milhões de russos tinham deixado o país nos últimos 26 anos, quando o total da população nesse imenso território multiétnico e multirreligioso se situa hoje nos 147 milhões.
A emigração tornou-se um grave problema da Rússia, em particular entre os jovens formados, mas a taxa de natalidade recuperou nos últimos anos devido a uma política familiar sustentada com apoio dos ‘media’ estatais.
No entanto, as projeções admitem que o crescimento da população poderá manter-se muito baixo, mesmo nulo, e que a imigração não compensará este défice nos próximos 20 anos.
Para além dos desafios económicos, esta situação pode colocar à Rússia a questão de uma possível convulsão na paisagem étnica e religiosa do país. No entanto Putin manteve-se muito popular, e quando também conseguiu colocar a Rússia como um ator decisivo no xadrez geopolítico internacional.
Putin cumpriu dois mandatos presidenciais entre 2000 e 2008, antes de ocupar o posto de primeiro-ministro durante quatro anos. Depois, o seu ex-primeiro-ministro Dmitri Medvedev optou por apenas cumprir um mandato presidencial de quatro anos, mas sempre muito dependente do seu mentor.
Quando estava em funções no Kremlin, Medvedev prolongou o mandato presidencial de quatro para seis anos através de uma emenda constitucional.
Assim, quando assumiu o seu terceiro mandato presidencial em 2012, Putin já beneficiou desta medida, que se mantém após ter assumido o seu quarto termo em 2018.
Ao sublinhar que a Rússia continua a necessitar de um líder forte em tempos de grandes convulsões internacionais, Putin promoveu recentemente uma vasta reforma da Constituição, aprovada em 16 de março pelo Tribunal Constitucional e que será plebiscitada em abril, que lhe permitirá designadamente garantir dois mandatos suplementares após o final do atual, em 2024.
Apesar dos protestos populares comedidos motivados por uma reforma das pensões, e das tentativas de regresso à rua de uma oposição ainda muito atomizada e confrontada com uma tentativa de controlo generalizado, a “doutrina Putin” mantém-se popular.
Uma sondagem publicada na terça-feira pelo Centro Russo de Estudos de Opinião Pública (VTsIOM), 61% da população apoia a emenda constitucional que permitirá a Putin candidatar-se a um quinto e sexto mandato presidencial, até 2036, apesar de não considerar que seja esta a alteração mais importante na Constituição.
Para os inquiridos, e na perspetiva do plebiscito convocado para 22 de abril, a emenda mais importante consiste nas medidas sociais previstas, em particular a que obriga o Estado a assegurar a disponibilidade e qualidade dos serviços de Saúde.
Numa Rússia onde os valores tradicionalistas e conservadores em termos sociais se voltaram a impor, incluindo através da “aliança” promovida entre Estado e a hierarquia religiosa ortodoxa, Putin parece manter todas as condições asseguradas para se manter no Kremlin até 2036, apesar dos colossais desafios que continuará a enfrentar.