Governo autoriza restrições nos serviços de comunicações eletrónicas
As empresas de telecomunicações vão poder abrandar, bloquear e restringir serviços de comunicações eletrónicas durante a epidemia da covid-19, para garantir acesso ininterrupto a serviços essenciais, como os de saúde ou segurança, segundo um diploma publicado.
“Importa (...) acautelar a identificação dos serviços de comunicações eletrónicas que devem ser considerados críticos e os clientes que devem ser considerados prioritários, bem como definir as medidas excecionais e de caráter urgente que as empresas que oferecem redes e serviços de comunicações eletrónicas devem adotar para garantir a continuidade desses serviços”, determina o Ministério das Infraestruturas, no decreto-lei publicado na segunda-feira, em suplemento do Diário da República, e que entrou hoje em vigor.
O diploma determina que as empresas que oferecem redes de comunicações públicas ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público “devem dar prioridade à continuidade da prestação dos serviços críticos” e define quais os serviços, como os de voz e de mensagens curtas (SMS) suportados em redes fixas e móveis, os de “acesso ininterrupto” aos serviços de emergência (incluindo a informação sobre a localização da pessoa que efetua a chamada, e a transmissão ininterrupta dos avisos à população), e os serviços de distribuição de sinais de televisão linear e televisão digital.
O Governo define também no diploma quais são os clientes que, na prestação dos serviços críticos, devem ser considerados prioritários e aos quais deve ser dada prevalência pelas empresas que oferecem redes de comunicações públicas ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público, como serviços de saúde, de emergência e segurança, da administração interna, da proteção civil, postos de atendimento de segurança pública ou o Centro Nacional de Cibersegurança.
Prioritários são ainda determinados serviços públicos que o Governo considera “especialmente carecidos de suporte”, como a Segurança Social, o Instituto dos Registos e Notariado quanto a serviços do cartão de cidadão ‘online’ e chave móvel digital, o Centro de Gestão da Rede Informática do Governo, o Diário da República Eletrónico, a Agência para a Modernização Administrativa, a Autoridade Marítima Nacional e a Autoridade Aeronáutica Nacional, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social ou o Banco de Portugal.
Quanto aos arquipélagos, o executivo define serem prioritários o Serviço Regional de Proteção Civil e Bombeiros dos Açores, quanto ao funcionamento da rede integrada de telecomunicações de emergência, e o Serviço Regional de Proteção Civil da Madeira.
O diploma define ainda medidas excecionais que podem vir a ser implementadas, como priorização na resolução de avarias e de perturbações nas redes e serviços de comunicações eletrónicas ou gestão de rede e de tráfego, incluindo a reserva de capacidade na rede móvel.
Define ainda medidas de gestão de rede e de tráfego para prevenir os efeitos de congestionamento das redes, estipulando que as operadoras “devem, sempre que estritamente necessário”, dar prioridade ao encaminhamento de determinadas categorias de tráfego, e define a ordem decrescente de prioridade tanto na rede móvel como na fixa.
As operadoras devem ainda, acrescenta, “limitar ou inibir determinadas funcionalidades, nomeadamente serviços audiovisuais não lineares, de que são exemplo o de videoclube, as plataformas de vídeo e a restart TV, e o acesso a serviços de videojogos em linha (’online gaming’) e a ligações ponto -a -ponto (P2P), caso tal se revele necessário”.
Além destas medidas, o executivo determina que as empresas “ficam autorizadas a executar outras medidas de gestão de rede e de tráfego, nomeadamente de bloqueio, abrandamento, alteração, restrição ou degradação de conteúdos, relativamente a aplicações ou serviços específicos ou categorias específicas dos mesmos, que sejam estritamente necessárias” para atingir os objetivos de assegurar serviço ininterrupto a serviços essenciais.
As empresas ficam ainda autorizadas, pelo diploma, “a cursar tráfego específico de serviços de comunicações interpessoais, através de aplicações de mensagem instantânea ou de voz, sem restrições”, e a “reservar, de forma preventiva, capacidade ou recursos” de rede nas redes móveis para os serviços de voz e de SMS.
Mas estas medidas de gestão de rede e de tráfego “só podem ser adotadas para cumprir os objetivos” definidos no diploma e devem ser comunicadas ao Governo e à Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) previamente à sua implementação, ou quando a urgência da sua adoção “não permita a comunicação antecipada, no prazo de 24 horas” após a sua adoção.
O diploma contém ainda uma norma quanto à sensibilização da população, definindo que as empresas “devem promover campanhas de sensibilização da população para a possibilidade de a experiência de utilização dos serviços de comunicações eletrónicas vir a sofrer alterações durante a epidemia SARS-CoV-2, em função das soluções que tenham de ser adotadas” para assegurar a continuidade da prestação dos serviços críticos.
“As empresas (...) devem promover a difusão, junto dos cidadãos e das empresas, de guias de boas práticas e de utilização responsável das redes e serviços de comunicações eletrónicas, de modo a maximizar a disponibilidade das redes de comunicações eletrónicas para a prestação dos serviços críticos, sem prejuízo de o Governo assegurar a divulgação de conteúdos consistentes com esta mensagem”, especifica.
O diploma suspende também obrigações no setor das comunicações eletrónicas, como o cumprimento dos parâmetros de qualidade de serviço ou de prazos de resposta a reclamações, e introduz medidas de simplificação, como a dispensa da obrigação de licenciamento temporário de estação ou de rede de radiocomunicações.
“O disposto no presente decreto-lei prevalece sobre quaisquer outras disposições que com ele sejam incompatíveis”, ressalva o executivo no diploma, especificando que a sua produção de efeitos se iniciou na sexta-feira, 20 de março, e se mantém até à cessação das medidas de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica do SARS-Cov2 e da doença covid-19, conforme determinada pela autoridade nacional de saúde pública.
No preâmbulo do diploma, o Governo explica ter tomado estas medias no contexto de emergência de saúde pública que se vive no momento atual, considerando ser “essencial assegurar a prestação ininterrupta” desses serviços críticos à população, cuja maioria permanece nas suas residências, elevando as exigências de gestão da capacidade das redes fixas e móveis de suporte aos serviços de comunicações eletrónicas.
“Estas circunstâncias conduzem a um aumento substancial do tráfego cursado nas redes fixas e móveis e a uma alteração profunda do seu perfil e estrutura, fruto de uma utilização mais intensa dos serviços de entretenimento e interativos e da massificação do teletrabalho por um período ainda indeterminado, o qual assume importância crucial para a minimização dos impactos socioeconómicos da crise”, explica o executivo.
O novo coronavírus já infetou mais de 360 mil pessoas em todo o mundo, registando-se em Portugal 23 mortes e 2.060 infeções, segundo o balanço feito na segunda-feira pela Direção-Geral da Saúde.