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Crónicas

O bom, o mau e o mal-amado

Em semana de Carnaval, quase ninguém leva a mal. Não leva a mal o Tribunal Constitucional a tentativa de nomeação do socialista Vitalino Canas para juiz. Nem mesmo que o nomeado tenha sido porta-voz do Governo de Sócrates, deputado do Partido Socialista e secretário de Estado de Guterres antes de tentar lá chegar. Não levam a mal os pássaros do Montijo, a quem um secretário de estado isentou de serem estúpidos por se desviarem dos aviões do novo aeroporto. Nem mesmo que a igual conclusão tenha chegado um secretário de estado de Bolsonaro, depois de um derrame de petróleo no Brasil: “O peixe é inteligente. Quando vê uma mancha de petróleo, foge”. Vamos à crónica.

O bom: Os Especiais

Os atletas do Clube Desportivo “Os Especiais” sagraram-se campeões nacionais de futsal para jogadores com Síndrome de Down. Cada um deles merece ter o seu nome nesta crónica. A Ana Semente, o Roberto Pacheco, o Bráulio Costa, o Francisco Gouveia, o Luís Teixeira, o Ricardo Santos, o Hélder Ornelas, o Michael Santos e o seu treinador Rui Neves. Mas não se pense que “Os Especiais” ficam por aqui. Por lá treinam campeões nacionais de basquetebol, campeões europeus de atletismo, jogadores de boccia e outros tantos atletas que não se deixam definir pelas suas limitações. Basta ir ao pavilhão do CAB ou à pista de atletismo e testemunhar a intensidade de cada um deles. São atletas por direito próprio. Atletas como qualquer outro, e, em muitos casos, como nenhum outro. São especiais pela sua habilidade e não pela sua condição. Só uma diferença os distingue de todos os outros atletas. É que na pista de atletismo, no campo de futsal ou de basquetebol, “Os Especiais” competem por si e por todas as pessoas com limitações iguais às suas. Correm, treinam e jogam contra a ideia de que as pessoas com deficiência não podem ter acesso à educação, ao mercado de trabalho ou a uma vida social normal. Por isso, todos estes atletas madeirenses são mais do que especiais – são super-heróis.

O mau: Isabel Camarinha

Num congresso menos empolgante que o do Livre, mas mais concorrido que o do PSD, a CGTP elegeu a sua nova secretária-geral e líder espiritual Isabel Camarinha. Na verdade, a nova liderança da CGTP só pode ser do reino espiritual ou não fosse Isabel Camarinha funcionária sindical há 40 anos, nunca tendo trabalhado fora do sindicato que agora lidera. Camarinha representa, portanto, a derradeira evolução do sindicalismo português, o aperfeiçoamento final da representação dos trabalhadores. Depois de Mário Nogueira, que representa os professores mas não dá aulas há mais de 20 anos, ou de Ana Avoila, que depois de 34 anos de sindicalismo passa diretamente à reforma, a nova secretária-geral da CGTP elevou a fasquia. Agora podemos deixar de fingir que os sindicalistas são trabalhadores que defendem outros trabalhadores. O sindicalismo passou a ser profissão e os sindicalistas a representar-se a si próprios. Talvez por isso, o número de trabalhadores sindicalizados em Portugal tivesse caído de 60% em 1978, para 15% em 2016. Num país cuja Constituição continua a atribuir a estas organizações o monopólio da representação dos trabalhadores, a profissionalização dos sindicatos não pode ser uma boa notícia.

O mal-amado: Mário Pereira

Ao vigésimo dia, o inevitável aconteceu. E o pior, é a ideia que tudo isto poderia ter sido evitado. Poderíamos ter evitado o pedido de demissão de diretores de serviço, com o impacto negativo que esse facto teve no dia-a-dia do hospital. Teríamos, certamente, dispensado a politização de um cargo que não é político e cujo legitimidade só pode resultar do consenso entre pares. E, não menos relevante, teríamos poupado um profissional válido, com experiência e competência por todos reconhecida, a um julgamento popular que não merecia e a que um diretor clínico não pode estar sujeito. Talvez por isso tenha dificuldade em apontar vencedores e vencidos deste episódio. Não ganham os diretores demissionários porque os seus desafios diários mantêm-se, independentemente do diretor clínico escolhido. Não perde Mário Pereira, porque, apesar de tudo, tentou fazer parte da solução, num sector onde muitos parecem apenas concentrados nos problemas. Só lhe podem apontar ter chegado tarde, à conclusão que parecia evidente. Não há general, sem soldados. Agora, depois da tempestade, tem de vir a bonança. Até porque o barco pode ser muito bom, mas não aguenta tudo.

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