Crónicas

Vacinas em Portugal. Como e para quem?

Estamos todos a pensar no mesmo. As conversas que os cafés ainda permitem, entre palavras enviesadas e o incómodo que a máscara representa ( que diabo que não me consigo habituar a ela ) levam-nos para uma mensagem de esperança. Já estamos todos tão fartos e saturados, que tudo o que nós queremos é agarrar-mo-nos a qualquer coisa que nos mostre uma luz ao fundo do túnel. A vacina parece estar mesmo a chegar e entre guerras de laboratórios e uma pressa que nem sempre é amiga da perfeição, cá vamos esperando, impacientemente, para darmos inicio a essa viagem para o futuro. No entanto é preciso termos respostas para algumas questões que se levantam neste processo, que segundo nos prometem, será realizada em simultâneo para os diversos países da União Europeia.

Começo pela pergunta do “como?”. De que forma estamos nós, enquanto País, a estruturar a chegada dessa tão proclamada imunidade? Qual é a estratégia definida para o processo de vacinação coletiva que não terá seguramente paralelo com nada já alguma vez realizado? Esta semana acedi a um convite que me foi amavelmente endereçado para debater sobre as expectativas do Turismo pós pandemia, num famoso Summit sobre viagens e novas tecnologias, este ano realizado online, dados os constrangimentos. O moderador, alemão, contava no seu preâmbulo que estava a viver com natural excitação o desenvolvimento das estruturas de apoio e vacinação, aos milhares, espalhados um pouco por todo o País, já que um desses centros improvisados, estava a crescer há mais de uma semana, mesmo ao lado da sua casa. Por cá a informação continua a chegar a conta gotas e mais preocupante do que isso, sentimos mais uma vez, um atraso substancial na criação da comissão técnica de vacinação quando outros países já apresentaram a mecânica e o formato.

Sabemos que graças a sermos membro da União Europeia teremos acesso às vacinas ao mesmo tempo que os outros países, mas não sabemos como se está a desenrolar o processo de armazenamento ou o transporte para as ilhas. O próprio histerismo da chegada da salvação vai toldando alguma informação importante. Como por exemplo, sendo a maioria de duas tomas, ou seja para atingir o resultado pretendido será preciso cada pessoa tomar duas doses, qual será a distância entre ambas e o que nos pode acontecer se entre elas ficarmos infectados? Quais os efeitos secundários já detetados e quais as diferenças entre as várias marcas que se apresentam ao mercado? Segundo as notícias, umas têm mais eficácia do que outras. Podemos escolher entre elas? Qual o método? Hoje esperamos saber as respostas com a apresentação do Plano de Vacinação.

Mas estamos também todos expectantes para perceber a resposta ao “para quem?”. Mesmo que Portugal tenha bons exemplos no passado, quanto à eficaz execução de um Plano de Vacinação é sempre bom recordar que a logística para vacinar 7 ou 8 milhões de pessoas num curto espaço de tempo é sensivelmente diferente. As primeiras 300.000 serão direcionadas para que grupos? Começámos com um péssimo exemplo, na vacina da gripe, por parte da ex eurodeputada e candidata à Presidência da Republica, Ana Gomes. Usou dos seus contactos e influências e adquiriu a vacina em França. Não ponho em causa a necessidade de a receber. Mas esta ideia ( de que não nos livramos ) de que os mais poderosos chegam sempre primeiro, sobretudo alguns arautos da moralidade que se dizem impolutos gera logo uma natural desconfiança. Tudo o que não precisamos é de voltar a ver o triste espectáculo nas redes sociais de míudos a serem vacinados para a Gripe quando tantos idosos ficaram sem ela. Chegará aos que mais dela necessitam ou teremos mercado negro, cunhas e leilões ilícitos como em tantos outros casos? É que para o efeito, distribuí-las pelas pessoas erradas e fazer as mais necessitadas esperarem pela segunda ou terceira leva, pode significar o definhar e contribuir para o isolamento e até a morte em alguns casos.

Que será um grande desafio não tenhamos dúvidas. Ao nível da organização, da justiça social e da nossa capacidade altruísta e solidária. Fica o desejo de que chegue primeiro aos que mais dela precisam.

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