Europa e EUA vão marcar início da presidência portuguesa na UE
O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, diz que a presidência portuguesa da União Europeia (UE) vai ser marcada pelo "reencontro" com os Estados Unidos, propiciado pela eleição de um novo Presidente norte-americano.
"O primeiro semestre do ano que vem será marcado, do ponto de vista da política externa da União Europeia, por este reencontro entre a União Europeia e os Estados Unidos, e eu sei bem a palavra que estou a usar: reencontro. Depois de quatro anos de parênteses, trata-se de reencontrar", sublinha em entrevista à Lusa.
"Evidentemente que reencontrar não é regressar ao passado, mas é os europeus e os norte americanos falarem da sua agenda comum como amigos, como aliados, e não como adversários", acrescenta.
Segundo o ministro, a eleição de Joe Biden, ratificada na terça-feira pelo Colégio Eleitoral dos EUA, não vai levar a que fique "tudo como dantes, mas é um 'momentum' que não pode ser desperdiçado [...], é uma oportunidade única".
Vários encontros de alto nível estão desde já previstos, se bem que ainda não marcados, para que essas conversações ocorram: a cimeira da NATO -- e a partir da qual se pode combinar à margem uma cimeira do presidente dos Estados Unidos com o Conselho Europeu --, a reunião do G7, em junho, ou a Conferência de Munique sobre Segurança, habitualmente realizada em fevereiro e em que é possível que Joe Biden participe.
Segundo Santos Silva, há pelo menos três dossiês de grande importância recíproca sobre os quais as partes têm de falar: a agenda de comércio, cujas negociações sobre um tratado comercial UE-EUA foram suspensas pelo Presidente Donald Trump; a complementaridade entre a UE e a NATO e outras agendas multilaterais como a do Acordo de Paris.
"Temos de retomar as negociações, deixar para trás a época em que aprovávamos tarifas uns contra os outros e regressar à época em que discutimos uns com os outros a maneira inteligente de gerir as nossas divergências de interesses [...] e aproveitar os nossos interesses comuns", diz Santos Silva.
No âmbito da NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte), o ministro faz questão de realçar a importância de "olhar em conjunto para outras regiões do mundo", ao mesmo tempo que, relativamente às alterações climáticas -- afirma -- "os nossos objetivos não serão conseguidos sem a participação dos Estados Unidos", nem sem a China, a segunda economia do mundo, adianta.
"Diz-se muitas vezes que é preciso que o laço transatlântico se reforce, que haja este reencontro entre a União Europeia e os Estados Unidos no Atlântico Norte, mas eu digo mais: é necessário também que a União Europeia e os Estados Unidos se encontrem noutras regiões do mundo", sublinha Augusto Santos Silva.
A título de exemplo, o ministro cita o Acordo Económico Global assinado entre 15 países do Oriente, entre eles a China.
"A Europa e os Estados Unidos podem ficar de fora disto, limitar-se a ver, limitar-se a assistir e dizer: isto não é connosco? A minha resposta é não", declara.
Em relação à China, o ministro promete que "a presidência portuguesa da União Europeia também terá alguma coisa a dizer", já que "é provável que as negociações sobre o novo acordo de investimento entre a UE e a China não terminem até o fim do ano".
"Nós defendemos que a autonomia da Europa se consegue mantendo e reforçando a abertura da Europa ao mundo", destaca.
Segundo o ministro este é, precisamente, um dos grandes objetivos da presidência portuguesa: "poder chegar ao fim do próximo semestre, dizendo, nós contribuímos para que a abertura da Europa ao mundo [...] se faça de forma equilibrada, olhando para os vários polos que constituem hoje a multipolaridade do mundo", seja EUA, China, África, América Latina ou Índia.
A iniciativa de "convocar uma reunião de líderes com a Índia como uma das prioridades" da presidência portuguesa é, "justamente, mostrar que a Europa, para ser um ator global, tem que ter uma posição geopolítica equilibrada", garante.
"Não podemos olhar só para uma das regiões, temos de ser capazes de olhar ao mesmo tempo para várias regiões", completa.
O ministro confia que essa "capacidade de ouvir todos" há de marcar a presidência portuguesa, "e por aí contribuir para uma forma mais inclusiva e equilibrada de a União Europeia olhar para as diferentes regiões do mundo".
"Por isso é que se olha em toda a Europa com grande expectativa para a presidência portuguesa, porque se sabe que os portugueses são bons construtores de pontes e, portanto, esperam que os portugueses consigam falar com todos, escutar todos", conclui.