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Tratado de Lisboa criou obstáculos à proximidade dos cidadãos

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A questão de uma maior aproximação entre a União Europeia (UE) e os cidadãos europeus, um clássico no debate europeu, encontra no Tratado de Lisboa mais obstáculos do que apoios, consideram os responsáveis pelas três anteriores presidências portuguesas.

Depois de ter assumido a presidência da UE em 1992, 2000 e 2007, Portugal fá-lo, a partir de 1 de janeiro de 2021, pela primeira vez desde que o Tratado de Lisboa foi assinado.

A Lusa entrevistou os principais responsáveis pela coordenação das presidências portuguesas de 1992, 2000 e 2007 sobre o que mudou com o Tratado -- com o nome de Lisboa, porque foi assinado na capital exatamente durante a última presidência portuguesa.

Entre as várias mudanças introduzidas estão as figuras do presidente do Conselho Europeu e do Alto Representante para a Política Externa e a centralização das principais reuniões em Bruxelas e Luxemburgo.

"Acabar com a presidência rotativa e, por regra, estabelecer que as reuniões mais importantes são em Bruxelas ou no Luxemburgo desaproximou a Europa dos cidadãos, do ponto de vista simbólico", considera Manuel Lobo Antunes, secretário de estado dos Assuntos Europeus em 2007.

"Esse é um dos falhanços do Tratado de Lisboa", sentencia.

Compreendendo os argumentos de aumento de eficácia e de garantia de continuidade do trabalho, Manuel Lobo Antunes recorda que as anteriores presidências portuguesas foram "uma festa" para o país e os seus cidadãos, o que já mais dificilmente acontecerá a partir de 1 de janeiro de 2021.

Ainda que possa recorrer à figura dos conselhos informais, para trazer ao país algumas reuniões, Portugal verá a agenda dos acontecimentos da presidência concentrar-se em Bruxelas ou no Luxemburgo.

"O custo [do Tratado de Lisboa] foi esse: uma menor 'ownership' [propriedade] dos países e dos cidadãos", resume o atual embaixador de Portugal no Reino Unido.

A atual pandemia de covid-19 veio agravar ainda mais esse afastamento, assinala o embaixador Francisco Seixas da Costa, secretário de Estado dos Assuntos Europeus em 2000.

"Este afastamento no plano físico vai tornar a União numa coisa um bocadinho mais virtual para a maioria das pessoas. Não tem um efeito positivo sobre a apropriação pelos cidadãos da questão europeia", corrobora.

"Não me parece que a situação que vivemos facilite" a aproximação aos cidadãos, admite Seixas da Costa, lembrando que os tratados de Nice e de Lisboa "acabaram por afastar dos países os grandes eventos comunitários".

As reuniões descentralizadas davam "alguma dinâmica e alguma proximidade da União às coisas" e "até mediaticamente os países apareciam mais", recorda.

Ainda assim, Seixas da Costa admite que "o modelo telemático tem vantagens a prazo, no multiplicar do diálogo", e acredita que venha a desencadear "um salto qualitativo em termos tecnológicos".

Já a atual secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, sublinha que "não é por acaso que surgiu a ideia de fazer a Conferência sobre o Futuro da Europa, na base do que foram os diálogos com os cidadãos, que tiveram lugar há mais ou menos um ano".

A iniciativa pretende mostrar que "a União Europeia está presente na vida das pessoas" e que se preocupa com os seus problemas reais, mais ainda em contexto de pandemia. "A ideia é ouvir cada vez mais os cidadãos, trazê-los ao projeto europeu", realça.

Para o embaixador Seixas da Costa, é "chocante" que o Tratado de Lisboa tenha afastado os ministros dos Negócios Estrangeiros dos Conselhos Europeus.

A criação do cargo de presidente do Conselho Europeu "muda tudo: António Costa não vai presidir ao Conselho Europeu, como António Guterres presidiu, José Sócrates presidiu".

Além disso, lembra, quando vai para um Conselho Europeu, António Costa não leva o ministro dos Negócios Estrangeiros e a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, que o acompanha, não se senta no Conselho, "está no corredor, numa sala ao lado" -- o que também "muda tudo".

Hoje, "o país que assume a presidência está um pouco mais distante do centro de poder", nomeadamente no que à política externa diz respeito, avalia.

Recuando a 1992, a presidência portuguesa foi "uma reunião de família", numa altura em que a ainda Comunidade Económica Europeia (CEE) tinha apenas doze membros.

O na altura secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Vítor Martins, lembra que "a rotação das presidências era total, todas as áreas do Conselho eram assumidas pelo país" que tinha a presidência. Nesse sentido, "era mais fácil deixar marcas", compara.

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