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Resiliência, sustentabilidade e pessoas

Não é possível continuar a viver de crise em crise, de catástrofe em catástrofe, ignorando lições que a curta memória e o conforto do subsídio disfarçam pontualmente

As crises, de qualquer natureza ou intensidade, induzem transformações, mais ou menos duradouras, conforme os sistemas sobre os quais incidem. Dependendo do tipo de sistema que é submetido aos elementos determinantes de cada crise, da origem, interna ou externa, dos mesmos, da capacidade, conhecimento, consciência a vontade associada ao modelo e práticas de cada sistema em crise, emergem diversos cenários com resultados igualmente distintos. No caso dos sistemas humanos, ditos sociais e económicos, a primeira reacção é, naturalmente, de resistência. Identificadas as origens da crise, o combate directo com vista à sua eliminação e regresso à normalidade é, sempre, a primeira medida, num processo de pura resistência, acreditando que, controlada a ameaça e dominados os seus agentes, está garantido o regresso ao caminho, seja ele qual for.

A COVID 19 evidencia, tal como qualquer outra crise, mas agora de forma exacerbada, a insuficiência da estratégia de resistência, assinalando a necessidade de antecipar outros riscos, imprevistos, e de procurar estratégias capazes de reforçar a capacidade de combater mas, igualmente, de continuar, processo adaptativo em contínuo, modo de estar e gerir o presente e o devir. Uma cultura de resiliência, em detrimento da tradicional resistência, mostra-se mais promissora se incorporada a dimensão da sustentabilidade. Conseguir identificar os impactos imediatos e de médio prazo e entender a necessidade de estratégias integradoras da complexidade actual e futura, e capacitar todos os actores para essa realidade é, seguramente, a dificuldade maior, sem deixar de ter em conta a importância de comunicar essa visão quando a onda geral e muito ruidosa exige “apenas” o que sente que perdeu no momento.

Não é possível continuar a viver de crise em crise, de catástrofe em catástrofe, ignorando lições que a curta memória e o conforto do subsídio disfarçam pontualmente. Modelos lineares, dependentes de variáveis que pouco controlamos e que escondem vulnerabilidades e disparidades pouco visíveis na qualidade não chegam nem servem para o que se pretende. Neste domínio urge a mudança de paradigma que faça com que a sustentabilidade esteja associada a pessoas e não a empresas. Empresas, muitas, são entidades que rapidamente ficam fora de contexto, exigindo apoios em nome de pessoas a quem nem sequer asseguram condições de mínima dignidade, quer salarial quer social. São mais que muitas a utilizar a falácia do emprego, esquecendo as condições que efectivamente oferecem aos que empregam e, desse modo, consomem recursos que poderiam ser utilizados de modo mais sustentável, justo, e duradouro, para todos, empresas e pessoas.

Pessoas, ao contrário das empresas, nunca estão fora de contexto e merecem, sempre, o maior e melhor investimento possível. Capacitar cidadãos é o melhor investimento na sustentabilidade, acreditando que o seu engenho e determinação, como sempre, nos permitirá identificar caminhos, opções, ideias e ideais que alimentam a caminhada comum. O caminho das pessoas e não o caminho de construções oportunistas, especulativas e muitas vezes obscuras que descartam pessoas e as tratam como números fáceis na elaboração de convenientes folhas de cálculo. Com diferentes opções pelo meio, a escolha terá que ser clara, consciente, inteligente e capaz de evidenciar provas factuais da sua bondade. Isso passa, simplesmente, por submeter cada proposta ou decisão ao primado das pessoas, do seu bem estar, da qualidade do seu emprego, da decência mínima do seu modo de vida, em última análise, da garantia do seu direito à felicidade, em lugar do vago acreditar que metendo dinheiro em sistemas que o distribuem sob a forma de precariedade e da falta de investimento na qualificação e capacitação, que muito ajudaram a criar a imensa vulnerabilidade e insustentabilidade em que hoje vivemos.

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