Terceira Idade (Golden Age?)
Por mais que se sofisme, não é bom, nem charmoso, nem “golden” envelhecer. A única vantagem é ser a evidência de ainda estar vivo
Fui gentilmente convidado, pelo DN Madeira, a participar na conferência “Pensar o Futuro” sob o tema “Terceira idade – Golden Age”, no passado dia 20, no Savoy Palace, Madeira.
Os ilustres palestrantes, representando diversas sensibilidades sociais, políticas e profissões diversas, apresentaram os habituais argumentos, deram testemunhos personalizados, anunciaram intensões políticas que é suposto melhorarem as condições em que as pessoas chegam e vivem os últimos anos da sua vida, e tentaram encontrar e enumerar os factores que, não raras vezes, não o permitem.
O que nos assusta, enquanto seres humanos, tende a ser ou esquecido, ou minimizado ou…branqueado.
As duas inevitabilidades na vida de todos nós, o envelhecimento e a morte, fazem parte desses temas.
Ninguém gosta de evocar a morte, a sua própria morte, daí que, frequentemente, esta nos tome de “surpresa” mesmo que não resulte de um qualquer acidente inesperado. Raras são as pessoas que, tendo conhecimento da inevitável morte que os espera, se esforçam por criar condições para que tão infausto acontecimento não deixe a quem fica tormentos acrescidos. É vulgar acharmos que ainda “dá tempo”.
Idêntico fenómeno se passa com outra inevitabilidade (para quem tem a felicidade de uma vida longa): o envelhecimento, a velhice. E quando dele tratamos, quer no aspecto teórico, quer do ponto de vista prático, fazêmo-lo a contragosto e, muitas vezes, mal. Quando jovens, raros de nós pensamos que iremos envelhecer. A tendência dos jovens é tomar os mais velhos como “outros”. Distantes no tempo e no modo.
Acolhê-los com alguma sobranceria, de quem acha que são “cartas fora do baralho”. Que estão desfasadas do quotidiano. Ultrapassadas pela abrupta velocidade dos tempos modernos.
Mesmo o poder, quando trata o assunto, tem o “cuidado” de criar comissões, grupos de trabalho, regulamentos, decretos-lei, na sombra de gabinetes, de janela fechada, não vá a “doença” atingi-los.
Por mais que se sofisme, não é bom, nem charmoso, nem “golden” envelhecer. A única vantagem é ser a evidência de ainda estar vivo.
Obviamente que apesar de, teoricamente, todos termos os mesmos direitos e os mesmos deveres, nem todos temos as mesmas oportunidades. Não é a mesma coisa envelhecer numa boa habitação, com boas condições económicas, a possibilidade de viajar, ter um bom ambiente social e boa saúde (ou quem trate dela) ou viver angustiado sem um lugar onde encostar a cabeça e não sabendo se tem assegurada a refeição seguinte. Estar sujeito a listas de espera infinitas para consultas, cirurgias ou tratamentos. Contar os cêntimos para pagar a farmácia. Não ter hábitos de leitura nem de se interessar, permanentemente, pelo mundo que o rodeia.
Nascer num ambiente desafiante intelectualmente, estudar, ter hábitos de leitura, desenvolver interesses vários ao longo da vida, ter boas condições económicas e sociais, praticar desporto, não acontece a todos.
Embora não seja garantia de um envelhecimento saudável e feliz, ter tido alguns privilégios na infância, juventude e idade adulta é um factor extremamente favorável a que isso aconteça.
Para além de tudo isso, o sistema educativo não prepara ninguém para envelhecer bem. Talvez reflexo dos factores apontados no início deste artigo.
Actualmente, a esperança de vida, em quase todo o mundo, está alargada. Devemos incentivar os jovens a prepararem o seu envelhecimento. Devemos (o Estado) criar condições mínimas para que, quem não as tenha de raiz, possa viver o melhor possível os últimos anos de vida. Quando essas condições se verificarem talvez, então, possamos classificar a velhice de “golden age”, sem sofismarmos, usarmos bonitas metáforas ou “dourarmos a pílula”.