Testamento apressado
Na disputa de herdeiro o Estado é quem herda o dinheiro
Um moribundo às portas da morte, por não ter herdeiros diretos, apressou-se a escrever a sua última vontade. No entanto, a pressa foi tanta que não teve tempo de colocar vírgulas, pontos ou outros sinais de pontuação no texto. Rezava assim o testamento: Deixo os meus bens a minha irmã não a meu sobrinho jamais será paga a conta do padeiro nada dou aos pobres.
Processo em tribunal
Quem anda com demanda com o diabo anda. O cadáver estava ainda quente, já os herdeiros andavam interessados nas baronias do testamento. E como aonde vai o cão lá vão as pulgas, atrás de cada beligerante um astuto advogado fazia engrossar o número dos herdeiros.
Como ninguém se entendia, o caso acabou em tribunal, onde cada herdeiro através do seu advogado dava diferente interpretação ao testamento, colocando no texto os sinais de pontuação.
Interpretação do mesmo texto:
1) O advogado da irmã assim pontuava: - Deixo os meus bens à minha irmã. Não a meu sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.
2) O sobrinho assim interpretava o mesmo texto: - Deixo os meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.
3) O advogado do padeiro: - Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais. Será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.
4) O defensor oficioso dos pobres colocava assim a pontuação: - Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais! Será paga a conta do padeiro? Nada. Dou aos pobres.
O juiz da causa, zelando pelos interesses do Estado, acrescentou uma quinta interpretação: O testamento é equívoco, pelo que a herança deve ser deferida ao Estado na qualidade de único sucessível que, com segurança, o testador não o quis afastar.
Conclusão: Em disputa de herdeiro o Estado é quem herda o dinheiro.
* Baseado num texto do ilustre escritor Dr.Valério Bexiga, ex-presidente da OA de Faro.