Professora presa e torturada por reclamar falta de gasolina em Cojedes
Uma professora foi presa e torturada pela Polícia Nacional Bolivariana, na localidade de Tinaco, Estado de Cojedes, 245 quilómetros a sudoeste de Caracas, por protestar contra a falta de gasolina no país, avança hoje a imprensa venezuelana.
A detenção ocorreu a 29 de agosto último, mas só agora foi conhecida, depois de a mulher, Denis Ávila, contar ao juiz de um tribunal "como foi golpeada, queimada com cigarros e encerrada num calabouço cheio de excrementos", explica o portal El Pitazo.
"Denis Ávila foi detida depois de passar uma semana numa fila para combustível. Uma comissão de funcionários policiais lhe impediu deitar gasolina numa estação de serviço de Tinaco. Foi presa, golpeada e abusada física e psicologicamente antes de ser apresentada perante um tribunal", explica.
No centro da discórdia esteve uma alegada reclamação pela suspensão do abastecimento de combustível à população, enquanto funcionários policiais mantinham uma fila paralela, preferencial, inclusive para viaturas particulares, onde era permitido abastecer, apesar de não existir correspondência entre o último número da matrícula e o dia da semana estabelecido no calendário oficial de acesso à gasolina.
"Em instantes as pessoas que reclamavam foram emboscadas por funcionários policiais. Nunca houve intenção de bloquear a estrada ou protestar, apenas queriam respostas", explica o El Pitazo precisando que algumas pessoas foram espancadas no local por alegados oficiais das forças de segurança.
Uma vez na prisão, funcionários policiais teriam tentado, sem sucesso, obrigar a vítima a ser fotografada num cenário em que apareciam engenhos explosivos domésticos, pneus e garrafas. Como resistiu, a professora foi atirada contra uma "vidreira" que se rompeu, enquanto os polícias gritavam "aqui mandamos nós, vocês estão presos".
Na audiência em tribunal, cuja data não foi revelada pelo portal, o Ministério Público acusou a professora dos delitos de obstrução de via pública, alteração da ordem e ultraje a funcionário público.
Antes da leitura da sentença, o juiz concedeu a palavra a Denis Ávila, que, na sala de audiência, contou com pormenores os maus-tratos a que foi submetida após a detenção e mostrou os sinais físicos que ainda ficavam das queimaduras nos glúteos, seios e braços, e que não constavam do expediente policial.
O juiz concedeu-lhe liberdade plena e ordenou ao Ministério Público iniciar uma investigação sobre as torturas realizadas.
Apesar de esperar justiça para o seu caso a vítima diz ter medo de possíveis represálias dos funcionários policiais denunciados, uma vez que passou de acusada a acusadora.
Desde há vários meses que na Venezuela são cada vez mais frequentes as queixas da população de dificuldades para conseguir combustível.
Em 01 de junho, o Governo venezuelano fixou pela primeira vez o preço dos combustíveis em dólares norte-americanos, com subsídios para alguns setores básicos.
Em 10 de outubro vários deputados opositores venezuelanos denunciaram um aumento da repressão das forças de segurança contra a população, em particular nos protestos contra a escassez de combustível.
Segundo o Observatório Venezuelano de Conflitos Sociais (OVCS), em setembro último registaram-se 1.193 protestos no país, o maior número registado em um mês ao longo de 2020.
Ainda segundo o OVCS, 90% dos protestos foram para condenar o colapso dos serviços básicos no país, para reivindicar direitos laborais, saúde e alimentação, alguns dos quais começaram em reclamação pela falta de combustível no país.
Em setembro, segundo o OVCS, 74 manifestações foram reprimidas, obstaculizadas ou impedidas, em 19 dos 24 estados do país.
Uma pessoa faleceu, 233 foram detidas e 52 ficaram feridas no âmbito dos protestos.