Pandemia "empurra" jovens moçambicanas para casamentos prematuros
Organizações da sociedade moçambicana alertaram hoje que o novo coronavírus "empurra" e expõe raparigas a casamentos prematuros para "garantir alimentos à família", um flagelo que já afetava quase metade das mulheres mesmo antes da pandemia.
"Muitas das nossas famílias perderam a fonte de renda [com a pandemia] e as filhas vão ser empurradas para casamentos prematuros. Quanto mais tempo a rapariga estiver em casa, a sua exposição a esta situação é ainda maior", disse Santos Simione, representante da Coligação para Eliminação das Uniões Prematuras (CECAP).
O representante da CECAP falava durante uma conferência de imprensa em Maputo por ocasião do Dia Internacional da Rapariga, assinalado no domingo sob o lema "Minha voz, para um futuro de igualdade".
Segundo as organizações, o novo coronavírus tem um impacto "muito grande" sobre as raparigas em Moçambique, que sofrem "pressão" dos pais e muitas vezes são obrigadas a casar.
"É ela [a rapariga] que tem, em algum momento, de procurar a comida para a família e às vezes, para consegui-lo, é condicionada, e uma das questões acaba sendo o casamento", referiu Santos Simione.
"A pandemia está a exacerbar a questão dos casamentos. Muitos pais perderam a possibilidade de ter os seus rendimentos e a solução é casar as filhas", sublinhou Rosária Mabica, diretora de programas da Plan International.
De acordo com a CECAP, Moçambique continua a registar uma das taxas mais elevadas de prevalência de uniões prematuras, com cerca de 48% das raparigas a casarem-se antes de atingir os 18 anos.
Além dos casamentos prematuros, a violação sexual, gravidez precoce, maus tratos, trabalho forçado e dificuldades no acesso à educação, são outros desafios que se colocam à rapariga em Moçambique e que se "agravam" com a covid-19.
"Muitas raparigas, por estarem em casa, não têm tempo para se concentrar nos estudos, porque todas as tarefas domésticas passam para a sua responsabilidade", disse a diretora da Plan International.
"Se mesmo em momentos de alguma normalidade a nossa rapariga é desafiada por vários dilemas, imaginemos então numa época em que vivemos com a covid-19. A situação é ainda pior, os desafios só vieram agravar-se", concluiu Santos Simione.
O Dia Internacional da Rapariga, celebrado em 11 de outubro, foi instituído em 2011 pela Organização das Nações Unidas, com o objetivo de promover a proteção dos direitos da rapariga em todo o mundo e acabar com a vulnerabilidade, discriminação e violência de que elas têm sido vítimas.
A CECAP é uma plataforma constituída por mais de 54 organizações da sociedade civil, que se dedicam à defesa e proteção dos direitos da criança e da rapariga, com especial enfoque para prevenção e eliminação de uniões prematuras.
Moçambique regista um cumulativo de 10.001 casos positivos de covid-19, 71 mortos e 7.338 casos recuperados (cerca de 73%).