Análise

O cerco às notícias

Três episódios definem o ADN de uma casta que tem aversão à informação

Antes que nos ponham a mordaça, que de diversas formas bem tentam colocar sem sucesso, importa que saibam que não nos calam com expedientes reprováveis e atentatórios dos direitos em vigor.

Da semana que passa há três exemplos de como os poderes lidam mal com a liberdade de informação e de expressão, prevista na Lei, e que deviam conhecer e cumprir.

1. Um secretário regional, que só deve ler jornais quando é notícia, lamentou um “título bombástico” - PS chama Pedro Fino para explicar esventramento da Ribeira Funda – mas dele tirou proveito para ter espaço mediático.

Na prosa que publicamos não resiste a deixar “um reparo final acerca da conduta do DN” por alegadamente publicar “uma página de acusações sem sentido” e sem “qualquer preocupação com a necessidade de assegurar o contraditório”. Fá-lo como se um pedido assumido por um líder parlamentar, independentemente do partido que representa, com declarações que lhe estão devidamente atribuídas e que o responsabilizam, careça de consentimento e audição prévia de todos os visados na notícia. Este governante não pensou antes de escrever, mas percebe-se que é outro que detesta o escrutínio público e a informação.

Mas se o secretário do Equipamento e das Infraestruturas quer mesmo abordar as questões de conduta, então que comece por casa. Tente averiguar quem é que na sua secretaria ou no seu gabinete, quando confrontado com perguntas feitas por um jornalista do DIÁRIO, daquelas que numa fase de investigação se colocam obrigatoriamente às partes atendíveis, e que só a essa secretaria caberia responder, as fez chegar sem demora a terceiros nunca mencionados nas questões, sabe-se bem com que intenção.

Numa democracia exemplar, estes tipos de comportamentos, indiciadores de perigosas dependências e submissões, dariam demissão imediata do infractor.

2. A Conferência de Representantes dos Partidos na ALM decidiu que a recolha de imagens das televisões deveria ser feita num local do hemiciclo que permita filmar os deputados do PSD de frente. A ‘localização’ imposta foi recusada e bem pela RTP-M e as imagens continuaram a ser captadas no local habitual, na área reservada aos jornalistas.

O episódio vale mais do que aparenta e do mesmo sobram três aspectos:

. A oposição andou anos a ser filmada de costas e o PSD nunca se ralou com o assunto. Agora que é alegadamente lesado acorda para um problema que já devia ter resolvido pois sempre mandou naquela casa.

. Um parlamento que não dá as melhores condições de trabalho aos jornalistas não se dá ao respeito e compromete um dos pilares da democracia.

. Colocar numa cerca ou num aquário os jornalistas, privando-os de tudo ouvirem e verem para melhor elucidar os madeirenses é ofensivo. E no caso em apreço, bastava que o presidente do parlamento e o seu assessor, com larga experiência no jornalismo televisivo, explicassem a quem faz queixinhas, que o jornalista e o camarada operador de câmara são indissociáveis em determinadas reportagens.

3. As Autoridades de Saúde da Região especializaram-se a pregar moral e bons costumes aos jornalistas. Isto porque um médico infectado, não se sabe onde e quando, foi notícia, em diversos momentos actualizada, à medida que surgiam mais elementos informativos, numa primeira fase deliberadamente ocultados e depois divulgados contra vontade.

O sermão inclui exortações “rigor, transparência, assertividade e diálogo”, à importância da “validação junto de fontes oficiais e institucionais”. Repudia “a desinformação e a ausência de fontes credíveis que são geradoras de insegurança junto da população” e apela “ao bom cumprimento das regras deontológicas que regem a actividade de todos os profissionais”. Mais, define como principal missão do jornalista “comunicar a verdade dos factos”, considerando que todos os seus profissionais devem assumir-se como “parceiros”.

Bem prega a Saúde, feita de entidades que frequentemente desrespeitam regras básicas decorrentes do exercício do contraditório, quando mandam para todos as respostas às questões colocadas por alguns, de modo a esvaziar assuntos; que omitem informação relevante que deviam disponibilizar, de que são exemplos os dados de desempenho por actualizar há mais de um ano e os números das listas de espera; que acenam com a deontologia, da qual fazem tábua rasa pois perante notícias alusivas à falta de ética dos seus pares quase sempre preferem perseguir o mensageiro.

Às Autoridades de Saúde da Região - em especial, às que têm responsabilidades na administração da coisa pública e que se armam agora em reguladores dos media sem que tenham competência para tal - o que se pede é transparência, celeridade e lealdade no seu relacionamento com os órgãos de comunicação social, sabendo de antemão que os estatutos e os princípios que os regem são inequívocos e escrutináveis.

Se têm razões de queixa sobre o desempenho da profissão de jornalista devem agir em conformidade – afinal não há profissão mais escrutinada do que esta -, mas deixem-se de generalidades abusivas sobre um trabalho que não dominam e nem sempre deixam concretizar. Por isso, sugerimos que o tempo utilizado para tentar denegrir os órgãos de comunicação social e os seus profissionais seja redireccionado para as respostas atempadas aos pedidos de informação pelos mesmos solicitados. Isso, sim, contribuirá para uma informação ainda mais precisa por parte da comunicação social madeirense da qual este DIÁRIO que hoje completa 144 anos faz parte com responsabilidade acrescida.

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