Defensores dos direitos humanos criticam lavagem de imagem dos sauditas com rali Dakar
Uma quinzena de organizações não-governamentais (ONG) criticaram hoje a realização do antigo rali Paris-Dakar, a partir da Arábia Saudita, por corresponder a uma operação de lavagem de imagem, através do desporto, o designado ‘sports-washing’ em inglês.
Entre aquelas ONG estão os Repórteres sem Fronteiras (RSF) e o Comité de Proteção de Jornalistas, a Human Rights Watch, a Liga dos Direitos Humanos e a Federação Internacional dos Direitos Humanos, que tem entre os seus membros a Liga Portuguesa dos Direitos Humanos -- Civitas.
Em comunicado, aquelas ONG denunciaram que a organização deste tipo de eventos pretende escamotear as gravíssimas violações de direitos humanos cometidas pelos dirigentes sauditas.
Em particular, desde o assassínio do jornalista dissidente saudita Jamal Khashoggi, em outubro de 2018, no consulado da Arábia Saudita em Istambul, na Turquia, que os dirigentes do regime de Riade têm enfrentado críticas internacionais.
Em causa está a sua falta de transparência na investigação ao assassínio de Khashoggi, a detenção e tortura de ativistas defensores dos direitos das mulheres e as suas responsabilidades em crimes de guerra cometidos durante as operações militares no Iémen.
As ONG acusaram também o executivo saudita de criar um ambiente hostil para quem exprimir críticas, incluindo jornalistas, escritores e defensores dos direitos humanos, através de detenções arbitrárias, tortura e levando a julgamento dezenas de ativistas pelas suas reivindicações, apesar de expressas de forma pacífica.
Entre as pessoas detidas, especificaram as ONG, estão as ativistas dos direitos da mulher Loujain al-Hathloul e Samar Badawi, que defenderam o direito das mulheres à condução de veículos automóveis e o fim do discriminatório sistema de tutela masculina.
Al-Hathoul e Badawi, juntamente com Nassima al-Sadah e Nouf Abdulaziz, estiveram entre uma dúzia de ativistas defensoras dos direitos das mulheres detidas em 2018, em retaliação por organizarem uma campanha pacífica para a promoção e proteção dos direitos das mulheres no reino.
Algumas mulheres relataram que foram sujeitas a choques elétricos, chicoteadas, e vítimas de ataques sexuais e outras formas de tortura durante os interrogatórios. Algumas foram sujeitas a períodos prolongadas de detenção em regime de isolamento.
Estas mulheres, que permanecem detidas, estão a ser julgadas, juntamente com outros ativistas temporariamente libertadas, sob acusações unicamente relacionadas com o seu ativismo.
Existem outras 14 pessoas apoiantes destas defensoras dos direitos das mulheres foram detidas em março e abril de 2019, que permanecem em prisão sem qualquer acusação.
Em junho de 2019, a relatora especial da Organização das Nações Unidas para as Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias, Agnes Callamard, apresentou as conclusões da sua investigação ao assassínio de Khashoggi.
Estas apontaram para a responsabilidade do Reino da Arábia Saudita neste assassínio e salientaram que as mortes extrajudiciais refletiam uma repressão generalizada de jornalistas, dissidentes e pessoas levadas a tribunal, bem como uma cultura de impunidade aos níveis mais altos.
No seu documento, Callamard recomendou inclusive que as empresas “estabelecessem políticas explícitas para evitar entrar em relação com empresas, empresários e órgãos do Estado (saudita) que tenham tido um papel direto ou indireto na execução de Khashoggi ou em outras graves violações de direitos humanos”.